quarta-feira, 2 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(ainda sobre a guerra)

Alguns comentarios rápidos:

As razões dadas pelo HA para continuar a 'resistencia' depois da retirada israelense: ... São pretextos bem transparentes.

A 1a razão dada é que Israel supostamente continuaria ocupando terra libanesa. As famosas 'Fazendas de Sheeba' são um pedaço minusculo de terra desabitada, que ficava na fronteira entre Siria (nas colinas de Golan) e Libano. Até 1967 eram ocupadas pela Siria, sem qualquer cotroversia aparente. Após a guerra dos 6 dias, passaram a ser ocupadas pelos israelenses. Todos os mapas existentes (alguns da epoca otomana e colonial, outros produzidos pelos governos tanto Sírio quanto Libanês), exceto um de origem considerada duvidosa, indicam que as FdS seriam parte da Siria. Foi isso que a ONU concluiu quando confirmou que a retirada Israelense tinha sido completa.

A coisa parece simples, mas lembre-se que isto é o Oriente Médio. Após 2000, o HA começou a reclamar da 'ocupação' das FdS. Os demais politicos libaneses acabaram repetindo a retorica, com diferentes graus de sinceridade, devido tanto a popularidade quanto a necessidade de incluir HA na coalizão governante. A Siria, que dominava o Libano até o ano passado, tinha uma postura dúbia, de apoiar a luta pela 'libertação' das FdS, ao mesmo tempo em que se recusava a demarcar suas fronteiras com o Líbano.

A segunda justificativa dada pelo HA são os prisioneiros. Este é um assunto espinhoso; durante a ocupação os isralenses e seus aliados do SLA mantinham inumeros prisioneiros libaneses sem nenhum processo judicial e em condições abismais. Mesmo depois de 2000, alguns ainda permaneceram em prisões em Israel. A maior parte foi libertada em troca de 3 soldados israelenses mortos e um 'empresario' (provavelmente um traficante de drogas) vivo, todos sequestrados pelo HA.

O numero restante não é divulgado, mas não é alto. Aparentemente Israel está disposto a troca-los por um aviador que foi derrubado sobre o Libano em 81, e que acredita-se foi capturado ou morto pelo HA ou seus aliados. O HA nunca especificou quais prisioneiros quer ver livres, exceto pelo simpático Samir Kuntar, que em 79 se infiltrou em Israel e matou 3 membros de uma familia e um policial antes de ser preso. O seu retrato figura de forma proeminente nas manifestações do grupo xiita.

No final das contas o Nasrala já indicou que se as FdS forem devolvidas, exitem sempre outras razões para continuar resistindo. Ele já mencionou 7 aldeias, que hoje fazem parte de Israel, mas que tinham maioria xiita até 1948. Certamente ainda tem muita 'Palestina ocupada' (que é como HA se refere a Israel) para ser libertada.

Eu não quero dizer com isso que o HA tem os meios, ou mesmo a intenção, de marchar até Tel Aviv. Mas ele certamente está tentando usando o meme da 'ocupação' (poderoso por razões obvias entre os Arabes) para perpetuar um estado de guerra que objetivamente não serve aos interesses nem de Israel nem do Libano.

Neste sentido, o premiê Libanês propos um plano inteligente. Uma retirada Israelense das FdS seria organizada após as fronteiras serem demarcadas, HA e Israel trocariam prisioneiros; e o HA seria desarmado e uma força internacional ajudaria o exercito Libanes a ocupar o sul do Libano. É uma maneira bem sacada de dar ao HA o que ele diz querer, e tirar do HA o que ele quer realmente. Acho que um acordo eventualmente sera algo deste tipo, mas resta convencer as partes beligerantes.


O presidente Libanes Emille Lahound: ... É uma piada de mau gosto. Ele é um preposto Sírio; a emenda constitucional que extendeu o seu mandato foi o que levou o Rafik Hariri a se posicionar abertamente contra Damasco, o que resultou na sua morte via carro bomba. A enorme reação popular que se seguiu, junto com o apoio dos EUA, França e Arabia Saudita; e a ameaça implicita das tropas americanas junto a fronteira sirio-iraquiana, forçou os Sírios a se retirarem do Líbano. Depois da retirada, os objetivos do governo reformista libanes (liderados por Siniora, esquentando a cadeira para Hariri jr.) eram, em ordem: 1) Se livrar de Lahoud; e 2) Desarmar o HA. Acho que impedir progresso em ambos os casos foi um dos objetivos do HA quando iniciou essa guerra.

No final das contas, Lahound não represente ninguem, não manda em nada, e acha o que o Bashir Assad manda ele achar. Ele é ignorado por todo e qualquer visitante extrangeiro exceto os Sírios e os Iranianos.

A preocupação israelense com os civis libaneses ...é no mínimo insuficiente. Para mim é obvio que Israel não matou aquele monte de crianças em Qana intencionalmente; é algo que é claramente prejudicial para o que eles querem fazer (i.e., continuar a atacar o HA, e fazer os Libaneses se oporem ao HA depois da guerra). Mas também é obvio que os Israelenses não tomaram todo o cuidado que deveriam. Por mais que o HA lance foguetes a partir de locais civis, isso não dá a IDF o direito de atacar toda e qualquer estrutura por perto sem se preocupar com quem está lá dentro. Se você examinar os relatorios diarios apresentados pela IDF, a maior parte dos alvos atacados consiste da chamada 'infraestrutura do terror', i.e., prédios em que se acredita o HA guarda armas ou material de apoio. De fato, atacar um predio, que é fixo, é muito mais fácil do que caçar lança foguetes montados em caminhoes moveis. Mas muitas vezes evidencia muito circunstancial é usada para incluir um predio ou outro nesta categoria. E o fato é que no sul do Libano prédios deste tipo quase certamente terão em seu interior civis que não puderam ou não quiseram escapar para o norte. O Sul do Libano está devastado, e familias inteiras ainda estão sende retiradas de sob os destroços.

A posição da Síria: ... É problematica. Muita gente acha que a Siria é a chave para resolver a situação. A cerca de uma semana eu conclui que em um acordo em que os EUA tirasse Damasco da geladeira diplomatica e Israel abrisse negociações para a devolução das colinas de Golan em troca de um acordo de paz, a Siria poderia demarcar a fronteira libanesa, e sufocar o HA impedindo o fluxo de armas iranianas. Fiquei um tanto decepcionado quando descobri que metade da blogosfera teve a mesma ideia quase simultaneamente...

Mas pensando e lendo mais um pouco, agora acho que essa solução talvez seja problemática, e provavelmente inexequivel. Para começar, exigiria uma mudança de paradigma geopolitica grande demais para um governo totalitário que essencialmente se define a partir de sua oposição virulenta contra Israel. Além disso, é dificel saber qual o preço que Assad jr. vai pedir; muito blogueiros libaneses temem que seja o retorno da influencia síria na politica Libanesa. Se for, o Oriente Médio estará andando em círculos, e os Libaneses estarão andando na prancha de um navio pirata.

Um comentário:

Zecao disse...

Parabens pelos posts Bruno! Eu estou lendo e aprendendo muito.