quarta-feira, 30 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
Procura-se Rosa Mara desesperadamente

Temos uma hóspede nova, Jacqueline, uma francesa que esteve viajando pelo Brasil nas últimas semanas. Ela já é avó, mas é muito mais descolada que muitos hospedes com metade da idade, que praticamente precisavam de ajuda para atravessar a rua. Amante de chá, ela quase me excomungou por esquentar minha água no micro-ondas...

Eu não sei porquê, mas no Brasil a experiência de pegar um ônibus, seja urbano ou inter municipal, é sempre uma aventura. Na rodoviária de BH, nossa intrépida exploradora gálica foi abordada por uma senhora, que pediu encarecidamente que ela levasse um envelope (contendo um histórico escolar, 1a a 5a série, concluídas em 1981, de uma certa Rosa Mara Angelo dos Santos) até a rodoviária do Rio, onde um parente estaria a sua espera. Por quê esta tarefa foi delegada à uma francesa de 60 anos que mal fala português (ao inves de, prex., usar o correio) eu não faço ideia.

O ônibus, porém, atrasou. Chegou depois do ônibus seguinte da mesma companhia. Houve um desencontro, e depois de procurar por seu contato (não especificado) por vários minutos, a Jacqueline desistiu e pegou um taxi. Ela chegou aqui sem saber direito o que tinha acontecido, com o tal histórico escolar num envelope onde estavam escritos o nome de uma cidade (Nova Iguaçu), dois nomes próprios e um número de telefone. A minha missão, caso eu decidisse aceita-la, era localizar a misteriosa Rosa Mara, e lhe entregar o documento, tão obviamente vital.

Se fosse fácil demais não teria graça. O telefone (sem DDD) no envelope não existe no Rio, e BH caí na Rádio Cidade. Os nomes (Hayla e Marcio Francisco, além da titular Rosa Mara, e o de seus pais) tampouco constavam na lista telefônica. Segundo o Google, Marcio Franciso havia sido aprovado em 2003 para o cargo de merendeiro em Niteroi, mas não havia nenhum numero ou endereço de contato.

Examinado o histórico, dava para ver, bem apagado, o carimbo da escola onde Rosa Mara havia estudado (a E.E. "Ari de Franca"). Rapidamente obtive um número de telefone no Google, e liguei.

Não, a escola não tinha o registro atualizado de Rosa Mara. Mas o documento é recente, argumentei. Ele foi emitido em maio de 2006. Será que a pessoa responsável por este tipo de coisa não se lembraria de algo? A secretária Joana foi prontamente localizada, e posta na linha. Sim, ela se lembrava. A mãe de Rosa Mara havia requisitado o documento, meses atrás. Joana não a conhecia pessoalmente, mas um jardineiro que trabalhava na escola conhecia a família. Ela se comprometeu a transmitir ao jardineiro uma mensagem para a família: Havia um estranho no Rio de Janeiro (telefone anexo), de posse do documento que provavelmente julgavam já ter se tornado um souvenir cercado de mistério em Paris.

Os canais de comunicação da família Angelo dos Santos foram ativados. Hoje de noite recebi a ligação de um primo de Rosa Mara. Educadamente, ele se desculpou pela confusão e a agradeceu os meus esforços (nunca me diverti tanto!). Finalmente, me deu o telefone do misterioso Marcio Francisco, aqui no Rio. Liguei para ele, atendeu Hayla. Marcio é um guarda municipal, poderia passar aqui em casa e pegar o documento. E assim foi feito. Há 30 minutos, Rosa Mara ligou. Marcio estava na portaria do prédio ao lado (me enganei de prédio! Dei o endereço antigo, por sorte é logo ao lado). Desci para encontrar um homem alto, negro, cerca de 35 anos de idade, que novamente me agradeceu e ofereceu votos de retornar o favor, e levou embora o histórico escolar de Rosa Mara.



Para quem estiver interessado em mais causos de ônibus,

Eu escrevi o texto abaixo para a Pendragão (um lista no yahoogroups criada pelo Zecão) uns três anos atrás, depois de outra viagem igualmente bizarra.

Yo!

Estou de volta no Rio. Fiz uma viagem horrenda de ônibus (comum), mas que não deixou de ser interessante. Não sei por que, as vezes me sinto um para raio de malucos. Já sentei do lado de uma freira que achava quadrinhos coisa do demonio, de um pastor americano que achava que *fisica* é coisa do demonio, além de todo tipo de pessoa
mal-cheirosa/barulhenta/chata. Mas desta vez foi pior.

Começou logo na saída. Uma velhinha e seu filho (tb já avançado em anos) começaram a conversar. Tudo bem, nada de mais. Mas a conversa continuou por horas, quase metade da viagem! Coisas do tipo...

A Mariazinha (que é casada com o Josué) não conversa mais com a Lígia (irmã do Heitor), porque a dona Ana (Mãe da Maria) expulsou o Juca (amigo do Heitor) de casa quando este terminou o noivado com a Albertina (afilhada de dona Ana). Mas dizem as mas linguas que...


Finalmente, depois de nos informar de todas as novidades em Cafundó do Mato Fundo, e das andanças de toda a arvore geneaologica dos Zé Goiaba de Almeida, eles cairam no sono, e se limitaram a roncar.

Enquanto isso, um velhinho que já não parecia muito normal começou a surtar (ele queria viajar de graça, e depois de finalmente comprar a passagem perguntou se o onibus ia para Curitiba). Ele dizia, em um tom fúnebre: "Vcs tão vendo o que eles querem fazer comigo!", e em seguida "O motorista quer me matar!", como quem anuncia um oraculo. O dia já ia amanhecendo, e depois que ninguem se protificou a salva-lo do motorista, o velhinho tentou primeiro pular do onibus (sendo agarrado por um
passageiro) e segurar o volante (sendo agarrado por *vários* passageiros, que provavelmente queriam tornar a sua profecia verdadeira). Entre gritos e mordidas, ele foi entregue a policia rodoviaria, que todos sabemos é subordinada aos Illuminati da Bavaria...

Depois de um engarrafamento basico de 2 horas, finalmente chegamos na Rodoviaria. Peguei um onibus para Botafogo, e me sentei na esperança de recuperar algum sono perdido. O motorista tinha métodos pouco ortodoxos de conduzir, porém. Enquanto viajava a uma fração consideravel da velocidade da luz (os carros a frente ficavam azuis, os de trás vermelhos), ele gritava "ALGUEM VAI FICAR NO CATUMBI?". Na falta de quem se manifestasse, ele passava zunindo pelo ponto. Alguns pontos depois nós passageiros já tinhamos entrado na onda, e respodiamos com um coro de NÃO!. Até que uma mulher se atreveu a descer em Laranjeiras (recebendo um coro de AAAAAAHHHHs como resposta), e a coisa perdeu a graça.

Agora que dormi 12 horas estou bem. Depois mando mais noticias.

[]s Bruno

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segunda-feira, 28 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
Keep walking II

Eu tinha a intenção hoje de escrever um post explicando o que diabos é a conjctura de Poincaré (e o que em breve será o Teorema de Perelman), e tentar dar uma ideia de como o Grigory Perelman conseguiu prova-la. Mas acabei passando o dia ou cuidando do Gabriel (que aparentemente se tornou adepto de power naps de 30 minutos, intercaladas com momentos de mal-humor), ou passeando com o Bilbo, ou fazendo compras, ou cozinhando. Acabo de ninar o Gabriel pela 4 vez essa noite; agora vou ler o jornal, tomar banho e dormir. O Perelman que espere.

PS: No Líbano a notícia é a entrevista do Nasrallah. Para alívio do Fernando não tenho saco agora para uma análise mais detalhada*.

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* Mas como diria o Magueijo, High Bullshit Content



A aviação israelense destruiu boa parte das pontes no Líbano, para impedir que o HA transportasse foguetes para dentro do país e reféns para fora. Claro que a maior parte dos milhões de libaneses que usavam as tais pontes nunca chegaram perto nem de uma coisa nem de outra. HT: Beirut Spring

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sexta-feira, 25 de agosto de 2006

Lebanon
An Objective? Guide

Para quem não tem a menor ideia do que eu estou falando, clique no link acima. É um descrição sumária dos principais grupos Libaneses, incluindo uma breve história.

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Casa, Rio de Janeiro
Dançando sobre o entulho em Haret Hreik

O Hassan Nasrallah é um novo tipo de lider árabe. Ele não faz promessas extravagantes, ou ameaças vazias. Longe da histrionice nasseriana, ele fala com uma voz pausada, irradiando calma e simpatia, e pontuando o discurso com a ocasional piadinha. Estou falando sério, dê uma olhada nas suas entrevistas. Quem entende árabe diz que ele transita com desenvoltura entre o árabe clássico (quorânico) e o coloquial do dialeto libanês. Ele é, em suma, tudo o que os candidatos a sanguessuga no horario eleitoral almejam: alguem que esbanja credibilidade para seu público alvo, e que projeta ao mesmo tempo competência e humildade.

Compare isso com a verborragia grandiloquente típica dos líderes árabes que já entusiasmaram multidões no passado. O Nasser provavelmente foi o campeão na categoria individual (embora Saddam 'mãe de todas as batalhas' Hussein e Yasser 'até Jerusalem' Arafat ofereçam um páreo duro). Mas no esforço por equipes, os Sírios mantém larga liderança. Desde 1948 eles lançam ameaças cabulosas de jogar os judeus no mar, e anunciam uma série de vitórias espetaculares, ao mesmo tempo em que levam surra após surra dos israelenses. Mantendo a tradição, Bashar al Assad vem se vangloriando por tabela da 'vitória da resistência', enquanto fulmina a covardia dos demais líderes árabes e ameaça retomar as colinas de Golan a força. O único problema é que ninguem parece leva-lo muito a sério...


Se ele esperava que o resto do mundo viesse até Damasco implorando por sua ajuda para acabar com a guerra, deve ter ficado muito desapontado. Apesar de inúmeros editoriais e artigos a respeito, EUA, França e os demais paises árabes o ignoraram solenemente durante toda a crise (exceto como alvo do ocasional comentário mordaz); o seu enviado à Liga Árabe saiu antecipadamente da última reunião, furioso por não ter nenhuma de suas propostas aceitas para a redação do documento final. Mais ainda, Assad se tornou motivo de piada em pelo menos parte da imprensa árabe (certamente com a concordancia de seus governos respectivos), que não poderia deixar de notar o contraste entre sua retórica beligerante e a calma que reina na fronteira entre Golan e o resto da Síria, initerrupta desde 1974.

Se Assad não tem muita credibilidade atualmente, Nasrallah está se esforçando para manter a sua. Não há nenhum entusiasmo para comemorar a vitória do HA, cuja vacuidade está se tornando cada vez mais obvia. As ufanistas celebrações em frente aos prédios demolidos de Haret Hreik gradualmente baixaram de tom. Nem mesmo entre os xiitas há qualquer apetite para a retomada dos combates; entre os não-xiitas evitar o segundo round da guerra se tornou um imperativo. No momento, o HA precisa se concentrar em manter a promessa de ajudar milhares de seus correligionários a achar onde morar.

As críticas às ações do HA, durante a guerra confinadas à blogosfera, agora começam a aparecer na imprensa e entre a liderança politica libanesa. Os críticos incluem até mesmo um pequeno número de xiitas. Logo após a guerra o HA tentou impor seus limites aos parâmetros do discurso politico. Com ousadia crescente, estes limites tem sido rompidos.

No final das contas, é possível que Nasrallah acabe derrotado, não por algum lider falastrão de algum dos outros sectos (existem vários), ou pelo eternamente confuso PM Olmhert de Israel; mas sim por um político que representa uma novidade ainda maior em termos retóricos: O come-quieto.

O PM libanês, Faud Siniora, também não é dado a grandes arroubos retóricos ou promessas vãs. Mas ao contrário de Nasrallah ele não projeta uma imagem de força, mas sim de fragilidade. É obvio para todos que ele é a parte mais fraca, colocado no meio de várias forças muito mais fortes, e com uma ínfima margem de manobra. Mas a sua posição de fulcro o torna o único capaz de construir um consenso nacional (ninguem, no Líbano ou fora dele, quer o retorno à guerra civil que a quebra deste consenso traria); e a suas opções limitadas dão um ar de inevitabilidade para suas ações. E aquele que constroi o consenso pode, se for sutil o suficiente, molda-lo na direção desejada.

Nenhuma outra pessoa, seja ele GW Bush ou Ehud Olhmert, poderia ter forçado o HA a aceitar a presença do exercito libanes ao sul do Litani, pela primeira vez em décadas, ou a apoiar, mesmo que só da boca para fora, a resoluçao UNSC 1701. O seu judo retórico continua para tornar efetiva a implementação da 1701; o discurso do governo foi mudando gradualmente, de expressões de solidariedade com a resistência logo após o cessar fogo, até promessas de tornar o exercito a única força armada no pais e de reforçar o patrulhamente das fronteiras (com a ajuda de uma UNIFIL que parece estar finalmente se tornando uma força efetiva). Hoje Siniora afirmou que o HA não esta mais em condições de iniciar outra guerra com Israel, e até aventou a possibilidade de um acordo de paz, uma ousadia que seria impensável antes da guerra, e que vai enfurecer Sírios e o HA*. Durante a guerra, Siniora fez com que a liga árabe adotasse seu plano para terminar a guerra. Isso garantiu que seria ele, e não Nasrallah, o interlocutor (por canais indiretos) de Israel em qualquer negociação. Se tiver sucesso, Siniora terá efetivamente roubado do HA os seus principais pretextos para a continuação da luta armada (i.e., prisoneiros e as fazendas de Sheeba). Um acordo de paz a lá Sadat é na prática improvável no futuro próximo, mas pouco a pouco os parâmetros do discurso vem se deslocando, e a margem de manobra que Nasrallah tem para falar e agir em nome de todos os libaneses é cada vez mais restrita.

É impossível dizer qual será o rumo que o Líbano tomará daqui para frente. Mas pelo menos por enquanto, o come-quieto Siniora teve sucesso em puxar o tapete por debaixo do Nasrallah. Este sabe perfeitamente o que aquele pretende, mas assim como Siniora não pode atacar diretamente a legitimidade da resistência, Nasrallah não pode taxar o primeiro ministro de traidor devido a legitimidade que ele adquiriu durante a guerra, dentro e fora do Líbano. É um tipo de xadrez peculiar, onde nenhum dos dois lados pode dar xeque, e todas as jogadas são indiretas.


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* Um acordo de paz deixaria a Síria totalmente isolada como o único vizinho com quem Israel não teria um acordo de paz. Desde que perdeu o apoio sovietico, a politica Síria tem sido evitar o confronto direto e pressionar Israel indiretamente usando aliados e prepostos libaneses. Claro que quem se estrepa com isso são os libaneses, mas isso combina com outra vertente da política síria, que é extender seu controle sobre o Líbano. Quanto ao HA, uma paz com Israel tiraria suas justificativas para se manter como um movimento armado; manter esta prerrogativa foi provavelmente o que motivou Nasrallah a começar a guerra.


UPDATE: Vejam também este artigo de Amir Taheri, um exilado Iraniano que repete o que eu disse acima com muito mais conhecimento de causa. Comentários pertinentes no From Beirut to the Beltway.

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quarta-feira, 23 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
Procura-se

Não, este não é um post sério sobre o física quântica, ou sobre o tal gato de Schrödinger. Mas continuando no tema de cartazes de 'Procurado':



HT: halfbakery

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terça-feira, 22 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
Instituto oferece milhão para quem achar Perelman



Brincadeira...

Para quem não sabe quem é Grigory Perelman, veja o meu post anterior

Como muitos esperavam, ele ganhou a medalha Fields, o mais alto prêmio da matemática mundial, por sua brilhante demonstração da conjectura de Poincaré. Como muitos temiam, ele não só não apareceu na cerimonia, como recusou a medalha, e o prêmio concomitante de U$ 1.000.000. Ele também deve ter direito a um outro prêmio, também de 10^6, oferecido pelo Clay Institute.

No fim, o jornal britânico Daily Telegraph finalmente achou o dr. Perelman. Não, como havia sido especulado, na Sibéria em combate mortal com ursos polares ou na Academia de Ciências de Vulcano, mas na casa da mãe*. Eles entrevistaram o cara, que parece ser efetivamente gente boa, mas com problemas sérios de auto-estima. Ele ainda não se decidiu sobre aceitar ou não o premio do Clay, apesar de viver desempregado com a mãe em São Petersburgo após se desentender com o seu antigo instituto de pesquisa. Grigory aind precisa aceitar a ideia de que o que ele fez É importante e que ele MERECE o prêmio...


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* Manchete: World's top maths genius jobless and living with mother

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domingo, 20 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
Só quanto a dona gorda cantar

Ainda não acabou. A troca de tiros (e bombas e misseis) entre Israel e o Hizbolá terminou (por hora), mas o conflito interno no Líbano para definir qual será o papel do HA daqui para a frente, não tão dramático mas provavelmente mais importante, está a pleno vapor.

O HA, com sua costumaz eficiência, começou na frente cantando a vitória da resistêncua em nome de todos os libaneses. A insistência e vigor destas celebrações (repetidas em Teerã e Damasco, e recebidas respectivamente com apatia e entusiasmo) indicam que seu objetivo é mais convencer do que comemorar. Sem nenhum resultado tangivel para mostrar depois de toda a destruição sofrida, mas também tendo em vista que Israel tampouco atingiu seus objetivos estratégicos, o HA tenta ganhar no grito. Em alguns casos com sucesso, como no mundo árabe em geral, e entre os xiitas libaneses. Mas me parece que os demais sectos libaneses estão se dando conta que não podem deixar a decisão de embarcar em uma guerra calamitosa nas mãos de um grupo extra-governamental que não presta contas a ninguem (dentro do Líbano pelo menos).


No que se refere a ações concretas, o HA também agiu rápido. Prometeu ajuda na reconstrução das áreas atingidas, e fez o possível para neutralizar a implementação da resolução 1701. O governo central libanês se viu forçado aceitar os termos do HA para poder enviar o exército ao sul. A insegurança quanto ao status do HA fez os franceses, imbuídos do espirito de 1940, recuarem no compromisso de enviar tropas de combate com um mandato amplo para reforçar a UNIFIL. Sem uma UNIFIL robusta, é pouco provavel que o exercito libanês tome medidas efetivas para desarmar o HA ao sul do rio Litani, ou impeça o seu rearmamento a partir da Síria. Estas eram as principais exigências israelenses para aceitar um cessar fogo. Uma 1701 capenga é quase uma garantia que Israel, que não tem o menor interesse no retorno do status quo ante (para usar a terminologia de uma certa ex-professora de Stanford), retome seus métodos mais diretos de desarmar o HA.

Os políticos libaneses de forma geral se sentem na obrigação de repetir muito da linguagem do HA (com graus variados de sinceridade). Mas aos poucos, uma reação sutil a esta colonização retórica se faz sentir. O primeiro ministro (Siniora), que cresceu muito em estatura durante a guerra, deu a entender que o exército irá reprimir violações do cessar fogo por parte do HA ('para não dar desculpas aos sionistas'), e acenou com a possibilidade de um acordo de paz com Israel (o que deixaria a Síria totalmente isolada) se este 'modificar o seu comportamento'. Obviamente são poucas as chances de qualquer uma das duas coisas acontecer logo, mas estas palavras solapam a legitimidade do HA para conduzir sua 'resistência' à revelia do governo.

Os demais líderes do movimento reformista foram mais explicitos. Saad Hariri (filho de Rafik, RIP) e Walid Jumblat (lider Druzo) deram entrevistas coletivas hoje. Ambos atacaram pesadamente a interferência Síria (afinal os dois tiveram o pai assassinado pelos Assad). Jumblat foi além, e questionou diretamente a lealdade do HA ao estado libanês, além de ironizar a sua suposta vitória. Ambos enfatizaram a união nacional, em oposição às ações unilaterais do HA.

Fica claro que o discurso tanto do HA quanto dos reformistas são centrados na noção (relativamente nova no contexto libanês) de patriotismo. Resta saber qual definição vai prevalecer, se a de patriotismo como resistência ou a de patriotismo como união de todos.

No final das contas, enquanto o conflito entre Israel e HA é bastante direto, a relação de ambos com o Líbano é bem mais complexa, envolvendo tanto ameaças veladas quanto persuasão na tentativa de influenciar o cálculo de perdas e ganhos do governo libanês. Este por sua vez tenta desesperadamente se equilibrar na corda bamba entre a retomada dos ataques israelenses, por um lado, e o retorno à guerra civil, pelo outro. Além disso, os paises que contribuirem para a reconstrução vão querer direcionar o uso do dinheiro, e a Síria ainda mantém uma influência considerável dentro do pais. São muitos os interesses divergentes; as forças internas libanesas podem ter alguma esperança de atingir um consenso; mas as forças externas não podem ser todas reconciliadas.

A grande tragédia do Líbano é ser sempre o campo de batalha para forças fora do seu controle. O resultado do atual conflito interno vai em grande parte definir se esta sina vai continuar se repetindo ou não; ou os libaneses vão forjar uma identidade nacional comum, ou vão continuar divididos, lutando por procuração as brigas dos outros.

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sábado, 19 de agosto de 2006

Casa, Belo Horizonte

Depois de passar alguns meses no Rio de Janeiro, sempre me assusto com a natureza lemingue dos pedestres belo-horizontinos. Em São Paulo rua se atravessa na faixa e com o sinal vermelho. No Rio, os pobres coitados a pé correm assustados, cientes da sua condição de presa. Mas em BH os pedestres convergem em massa a partir dos dois lados da pista, sem demonstrar a menor preocupação com o trânsito. Ou se sentam em mesas de bar colocadas em cima do asfalto, como se atropelamentos fossem uma paranoia inventado por maconheiros cariocas ou paulistas neuróticos.

De qualquer maneira, estou de volta, para um fim de semana muito rápido. Hoje foi a festa de despedida da Mari, que vai para Paris na semana que vem. Amanhã o André, Mi, Gabi, Marina, Mari e o Zecão virão para o almoço de dia dos pais que vou fazer*. Dá para matar alguma saudade deles quando venho para minha visitas relâmpago, mas vai demorar um tempo até me encontrar com a Mari de novo.

Falando em saudade, por essa hora já devia ter me acostumado. Minha família mora lá e cá, meus melhores amigos moram lá e cá. Sempre sinto que está faltando algo. No momento, esse algo consiste do Gabriel, da Ceci e até do Bilbo.

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*rosbife com crosta de ervas e arroz de sete grãos com carneiro e cebolas caramelizadas. A minha mãe fará strudel de sobremesa.

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quinta-feira, 17 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
Gênio Inachável

Um matemático russo resolveu um dos mais importantes problemas em aberto da matemática, e desapareceu logo em seguida. Nada indica que Grigori Perelman foi morto, sequestrado ou acidentado; da mesma maneira que Leonard Nimoy no episodio dos Simpsons, ele provavelmente conclui que sua missão na Terra estava completa e voltou para o seu retiro.

A prova da conjectura de Poincaré apareceu pela primeira vez como uma série de curtos papers na internet, que foram posteriormente destrinchados por outros matemáticos em uma prova formal com milhares de páginas. O arisco dr. Perelman é o favorito disparado para a próxima medalha Fields, e também para o prêmio de U$ 10^6 oferecido pelo Clay Mathematics Institute para quem resolver um dos chamados problemas do milênio. Segundo os colegas, Grigory não se preocupa muito com essas coisas.

A conjectura de Poincaré postula que qualquer coisa que se pareça com uma 3-esfera (i.e., onde qualquer laço pode ser comprimido suavemente até um ponto) é equivalente (i.e., pode ser amassada suavemente em) a uma 3-esfera. Dependendo da maneira em que conjectura é escrita, parece algo obvio ou irrelevante, mas na verdade é bastante fundamental.

Quanto ao Grigori, agentes da CTU patrulham a tundra siberiana construindo armadilhas com iscas em forma de cubos de Rubik em 4 dimensões , mas por enquanto sem sucesso.


Next problem: where's the genius who solved $1m maths puzzle?
From James Bone in New York and Jeremy Page in Moscow
Times online

The Poincaré conjecture, put foward more than a century ago by Henri Poincaré and proven by Grigori Perelman, above, holds that a closed compact, simply connected three-dimensional mainfold is homeomorphic to the three-dimensional sphere

THE search is on for a reclusive Russian mathematics genius who has solved a century-old problem called the Poincaré conjecture.

Grigori Perelman, 40, known as “Grisha”, is a leading contender to win the Fields Medal, the mathematics equivalent of a Nobel prize, at the International Congress of Mathematicians in Madrid next Tuesday.He is also in line to receive a $1 million (£530,000) cash prize from an American institute for his proof of one of the seven greatest mathematical mysteries.

However, colleagues describe Dr Perelman, who is said to have resigned his post at the renowned Steklov Institute of Mathematics in St Petersburg, as an unworldly figure who may not turn up in Madrid even if he wins his profession’s top honour.

Gang Tian, a Princeton professor who has co-written a 473-page guide to Dr Perelman’s proof of Poincaré’s conjecture, said: “He certainly has no interest in material things. If he gets the Fields Medal, there is the issue of whether or not he will accept it.”

John Ball, Sedleian Professor of Natural Philosophy at The Queen’s College, Oxford, who was involved in picking this year’s Fields Medal winner as the president of the International Mathematical Union, refused to say if he had been in contact with Dr Perelman. But he noted that the Russian recluse refused an invitation to give a lecture at the congress.

Mathematicians have been struggling with Poincaré’s conjecture since it was posed in 1904 by Jules Henri Poincaré, a French polymath. The conjecture tackles the nature of three-dimensional space. Simply stated, it posits that an object such as a pear or a banana is deformable into a sphere, whereas a bagel or American-style doughnut with a hole in the middle is not.

The British mathematician J. H. C. Whitehead claimed to have proved the Poincaré conjecture in the 1930s, but then retracted it. By 1960 Stephen Smale, now at the Toyota Technological Institute at Chicago, had proved it true in five or more dimensions. In 1983 Michael Freedman, currently at Microsoft, demonstrated that it was also true in four dimensions. Both won Fields Medals.

But mathematicians found it harder to prove it for three- dimensional space. In the 1980s Richard Hamilton of Columbia University proposed a new approach using a technique called the Ricci flow. It was this ground-breaking approach that Dr Perelman used for his proof.

Professor Tian first met Dr Perelman at New York University in the early 1990s. “He is easy to talk to on mathematics. He likes to walk a lot,” he said. “I did not find him strange.

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Casa, Rio de Janeiro
Vitória, derrota ou pizza?


(charge do Salt Lake Tribune)

A guerra acabou (ou, mais provavelmente, deu um tempo), e tanto o Nasralah quanto o Olmert já sairam cantando vitória a plenos pulmões. Fica entre o ridículo e o obsceno esta celebração toda. A única definição sensata de vitória ou derrota em um conflito é um computo dos objetivos estrategicos alcançados ou frustrados. Vitórias ou derrotas 'morais', definidas pela humilhação que causam ou a dignidade que restauram, são uma questão de percepção, que pode ser mudada pelo expediente de construir uma narrativa conveniente.

De concreto, só existem objetivos, que quando não são puramente existenciais, são essencialmente políticos, e definidos fora do contexto bélico. A guerra como politica por outros meios é uma ideia cínica, mas garanto que é melhor que a realidade da guerra como terapia coletiva. Neste contexto, esta foi uma luta inconclusiva entre Israel e Hizbolá na qual o Líbano foi o grande derrotado.

De volta aos carnavalescos, por um lado o Olmert (assim como o Peretz) está lutando para sobreviver politicamente; os Israelenses entendem que seus líderes foram indecisos e incompetentes, e não conseguiram obter nenhum resultado decisivo, apesar do apoio quase unânime à ação militar. Depois de mais de um mês, o HA sofreu grandes perdas mas ainda representa ameaça, e os soldados sequestrados ainda não voltaram para casa.

O HA, por outro lado, 'ganhou' a guerra da mesma maneira que o George W. Bush 'ganhou' debates: Estabelecendo espectativas baixissimas (ajudado por Olmert estabelecendo as suas na estratosfera), de modo que qualquer coisa além de obliteração completa ou o Nasralah em uma jaula em Tel Aviv seria considerada uma vitória em comparação. Mas o fato é que o Libaneses, quanto mais os xiitas Libaneses, não tem nenhum resultado positivo para mostrar depois de toda a destruição sofrida. As vitorias retóricas do HA beneficiam unicamente o HA.

Nasralah é provavelmente o lider árabe mais popular atualmente (fora do Líbano, dentro a situação é mais complicada), e o fato de Israel não ter desarmando o HA torna improvável que o exercito libanês ou a UNIFIL jamais o façam. Mas mesmo no plano político, está agora claro que o HA age em favor de interesses a) próprios b) iranianos e c) sírios, nessa ordem. O Líbano fica em algum lugar entre d) e z). Militarmente, apesar de afirmar que defendia o Líbano, a única coisa que o HA conseguiu defender com algum grau de sucesso foi a própria pele.

No final das contas, o resultado mais importante desta guerra nõa depende do número de baixas ou da destruição inflingida. A relação de forças dentro do Líbano está em fluxo, e ninguem sabe realmente se no final o HA sairá enfraquecido ou fortalecido. A insistencia em declarar vitória e prometer reconstruir 15000 moradias, são maneiras de enquadrar a percepção em termos que são favoráveis ao HA (resistência ao invasor, e o HA como a única garantia do bem estar de sua base xiita). Paralelamente, a intimidação dos críticos e daqueles que querem que o HA se desarme, é uma tentativa de forçar um consenso nacional com a ameaça implicita de guerra civil se for contrariado.

Os grupos que se opões ao HA por sua vez tentam moldar as percepções em termo de união nacional, e resistência à interferência extrangeira de modo geral (i.e., incluindo não só Israel, mas também Síria e Irã). Eles também manipulam o temor do retorna a guerra civil, ao dar a entender que outros grupos sectários eventualmente vão se rearmar se o HA insistir em se manter como um grupo armado.

O equilíbrio de poder parece pender para o lado do HA, como suas armas, diciplina e apoio do Irã e dos carros-bomba da Síria. Mas o HA terá também que prestar contas a sua base xiita, que está em grande parte desabrigada, e não pode se alimentar unicamente da retórica do Nasralah. O grosso do dinheiro de reconstrução virá dos sauditas e dos paises ocidentais, que vão tentar ao máximo apoiar o governo central. Nasralah terá que chegar a algum tipo de entendimento com o Siniora antes da chegada do inverno, ou se arrisca a perder sua cerdibilidade junto a sua base de apoio. Entre os não xiitas, apesar do que é dito em vários lugares, os ganhos em popularidade do HA são no máximo dúbios. A blogosfera libanesa criticou o aventurismo do HA durante a guerra, mesmo estando universalmente furiosa com os ataques israelenses. As declarações beligerantes do Nasralah foram muito mal recebidas, para dizer o mínimo.
Blogeiros podem não ser muito representativos (para começar nenhum deles é xiita, até onde eu sei), mas o sentimento certamente reflete uma corrente importante da população libanesa, que pode odiar intensamente Israel, mas provavelmente não quer manter um estado de guerra intermitente com a superpotencia local sem nenhuma perspectiva de ganho concreto.

Como eu disse, o resultado final é incerto. O HA pode neutralizar o governo e transformar o Líbano em uma república islâmica ou na Síria do Leste; ou ele pode ser marginalizado, e ver sua base de apoio migrar para partidos xiitas mais moderados. O mais provável porém é que tudo acabe em pizza, em que de forma tipicamente libanesa todos os lados fazem conceções refletindo o novo equilíbrio de forças, e as tensões são contornadas ao invés de resolvidas. Mas esse samba do levantino doido não pode continuar indefinidamente. Algum dia o Líbano vai ter que deixar de ser uma coisa diferente para cada uma de suas comunidades, e decidir se tornar um país de verdade. Até lá, um HA armado até os dentes às margens do estado é garantia da retomada do conflito, seja daqui a dias, meses ou anos.

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terça-feira, 15 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(ufff)

É impressionante como somos adaptaveis quando a nescessidade é forte e imediata. Há um ano atrás, se me dissessem que eu teria que cuidar de um bebê, aos berros na maior parte do tempo, até ele dormir duas horas depois, eu provavelmente acharia que era piada. E se me dissessem ainda que eu teria que dar banho, remédio e mamadeira, trocar fraldas, brincar e andar pela casa até ele cair no sono; que eu seria o único adulto na casa; e que não, não se tratava de uma brincadeira, eu provavelmente estamparia uma marca em formato de Bruno na parede, no meu pânico de sair correndo.

O fato é que hoje o Gabriel estava irritadiço, e precisei fazer tudo isso para acalma-lo. Hoje acho esta tarefa algo perfeitamente normal, embora cansativa. Foi só quando me sentei de volta no computador que me dei conta de quão extraordinário é dar conta disto tudo, quando no passado muito recente eu não sabia nem segurar um bebê direito.

PS: Estou dando uma recauchutada no ml42. Em geral na base no ctrl-c/ctrl-z, uma maneira meio Frankenstein de criar uma página nova com pedaços de html semi-digeridos de diversas páginas pré-existentes. Mas dá para aprender alguma coisa.

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segunda-feira, 14 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(a guerra acabou?)

Hoje as 8 horas (horario local, daqui a uma hora) o cessar fogo imposto pela resolução 1701 vai entrar em vigor.

A resolução foi aceita durante o fim de semana pelos governos do Líbano (no sabado, fazendo contorcionismo retórico para conceguir o aceite dos ministros do HA e preservar o consenso) e de Israel (no domingo, enfatizando os pontos favoraveis da resolução e relativizando a provável implementacao para lá de problemática). Surprendentemente, até o Nasrallah concordou. O diabo está nos detalhes...

A resolução estipula que o HA vai se retirar/desarmar no sul do Líbano, sendo substituidos por 15000 soldados libaneses e 15000 capacetes azuis da UNIFIL recauchutada, liderados pelos franceses. Haverá ainda um embargo de armas para grupos "não autorizados explicitamente" (provavelmente uma referência às freiras carmelitas de Sidon ou ao clube de bocha de Beit Jabel). A UNIFIL 2.0 estará autorizada a ajudar o exército quando solicitada. A resolução é regida peloo Capítulo 6 da Carta (i.e., resolução pacifica de conflitos: 'larguem suas armas; why can't we all be friends? '), não Cap. 7 (ameaças à paz, que autoriza o uso da força: 'mão na parede ou o pau vai comer!'); mas autoriza explicitamente no texto o uso da força para fazer cumprir o mandato, então é uma espécie de Cap. 6.5.


Outros pontos pendentes (Sheeba, prisioneiros, desarmamento definitivo do HA) são mencionados em diplomatês bem intencionado, mas sem imperativos. Uma outra resolução Cap. 7 é prometida para daqui a 30 dias.

Se implementada na íntegra, a resolução atinge a maior parte dos objetivos de Israel, e alguns dos objetivos dos reformistas Libaneses (inconfessáveis, para preservar a unidade; lembre-se do pavor bem justificado que os libaneses tem de tensões sectárias). O HA topou porque quer que a guerra acabe logo, para preservar mais do seu poderia bélico e poder capitalizar seus ganhos consideráveis em popularidade (no mundo árabe em geral; no Líbano a coisa é mais complicada). Provavelmente não tem a menor intenção de se desarmar ou atravessar o Litani. Hoje a noite uma reunião do gabinete libanes foi cancelada quando os ministros do HA, sob ordens do Nasrallah, se recusaram a aceitar tal retirada. Está claro que o 'aceite' anterior era condicional e bastante seletivo.

O meu medo é que o HA pare com os Katyushas (em troca do fim dos bombardeios), mas tente engatar uma guerrinha de baixa intensidade com os Israelenses no sul do Líbano, que é capaz de prolongar indefinidamente. A resolução exige que Israel se retire a medida que o exercito libanês e a UNIFIL 2.0 se posicionam, que é algo que nenhum dos dois tem a intenção de fazer enquanto o pau estiver comendo solto. Israel diz que não vai se retirar enquanto eles não vierem, e o HA promete continuar lutando enquanto Israel permanecer no Líbano. É uma sinuca de 3 bicos, mas único lado que pode extrair algum beneficio disso é o HA, que vai poder justificar retroativamente suas armas com mais um round de 'resistência' (causalidade obviamente não é o forte do Nasrallah), e taxar seus oponentes Libaneses como vendidos ou covardes.

Obviamente, nada é tão ruim que não possa piorar. Os sírios foram humilhados nessa história toda. As negociações passaram longe de Damasco, e o Assad jr. foi implicita ou explicitamente taxado de irrelevante ou pouco confiável. Os baathistas damascenos são notoriamente paranoicos e vingativos, e não acho improvavel que tentem melar as coisas para demonstrar o quão indispensáveis eles são. O Irã, embora mais influente, é menos perigoso. O seu interesse é manter o HA como uma ameaça estratégica a Israel, mas por isso mesmo não quer uma guerra de desgaste que impeça o seu rearmamento. E de qualquer maneira acho mais provável que deixem estas decisões de final de jogo para o Nasrallah.

Os israelenses querem eliminar o HA como ameaça estratégica. A estabilibidade do Líbano obviamente não foi uma prioridade até agora, no que pode vir a ser o mais desastroso erro estratégico da guerra. Nos últimos dois dias, correndo contra o relógio, as IDF invadiram em força o sul do Líbano (antes haviam 7000 soldados Israelenses ao norte da frontaira; agora são mais de 20000), na direção do Litani. Os israelenses, partidários da politica de que se você quer algo bem feito faça você mesmo, não acredita que o HA se desarme ou retire sozinho, e duvida que os franceses (quanto mais o brancaleônico exército Libanês) o obrigue a isso. Mas é possível que começar a maior ofensiva da guerra (incluido bombardeios hoje em Beirute de alvos sem nenhuma ligação aparente com o HA, que deixaram pelo menos 10 civis mortos) nos momentos finais antes do cessar fogo efetivamente acabe com o frágil consenso que tornou o próprio cf possível; neste caso os Israelenses se verão embrenhados no Líbano novamente, sem perpectivas de um acordo de paz ou uma vitória definitiva, e sem poderem recuar sem dar ao HA outra enorme vitória retórica. Exatamente a repetição do cenário que eles pretendiam evitar.

PS: Excelente artigo de Ali Kamel no Globo, sobre a historia das intervenções israelenses no Líbano, e sobre o que deve acontecer depois que a poeira baixar. E minha admiração pelo Siniora só aumenta. Como a parte mais fraca em uma briga de cachorro grande, ele dançou no fio da navalha para tentar salvar o Líbano e sua democracia incipiente. Me desculpem pelo excesso de metáforas, mas os links valem a pena.

UPDATE: O cessar fogo já começou, entre o momento que comecei a escrever este post e agora.


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*Forças de Defesa de Israel, na sigla em inglês mais usada.

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Primeiro dia dos pais


Hoje foi meu primeiro dia dos pais recebendo, e não só dando, os parabéns. Ainda sofro de um pouco de dissonância cognitiva com a situação, mas é uma d.c. muito boa de sentir. Hoje fomos com o Gabriel no forte de Copacabana, comer na Colombo e passear na praia. Nada de elaborado, um dia simples e perfeito.

Eu ia escrever mais, mas depois do que escreveram a Ceci e a Mari não sei nem mais o que dizer.

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sábado, 12 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(Resolução 1701, capítulo 6 e meio)

A Resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU , que estipula um cessar fogo e uma série de medidas para para resolver o conflito, foi aprovada por unanimidade hoje a noite

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quinta-feira, 10 de agosto de 2006

And now for something completely different

O governo israelense aprovou planos para um invasão em grande escala do Líbano até o rio Litani. As articulações diplomaticas para um cessar fogo colapsaram, com recriminações mútuas entre EUA e França.

E Amahdinejad espera a volta iminente do Imam oculto...

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terça-feira, 8 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(desarmando o HA, esnobando a Siria)

Continuando na linha 'lorotas contadas sobre a guerra', preciso mencionar mais algumas:

Dizer que o Líbano teve 6 anos para desarmar o HA: ... É no mínimo uma meia verdade. Para começar, por 5 desses anos o pais esteve sobre controle efetivo de Damasco. Mesmo após terem sido forçados a se retirar, os Sirios ainda mantiveram certa influencia atraves de alguns prepostos e aliados locais (c.f. o presidente, Emile Lahoud); e por sua aliança com o HA. Além disso, embora os reformistas libaneses (aka o movimento de 14 de março) tenham uma pequena maioria no parlamento, a aliança de coveniencia entre o HA e o grupo liderado por Michel Auon (um ex-general cristão, anteriormente oponente intransigente da Siria) efetivamente bloqueou a maior parte das reformas. Finalmente, a fraturada estrutura sectaria da sociedade libanesa torna quase impossivel um governo efetivo que não seja de união nacional. No final das contas Siniora (o premiê Libanes, um tecnocrata sério que ocupa o cargo esquentando a cadeira para Saad Hariri, filho do ex-premiê assassinado) foi obrigado a fazer um acordo que incluiu o HA no governo, e o reconheceu como um movimento de resistencia, e não uma milicia. O HA já demonstrou mais de uma vez que pode paralisar o geverno se decisões forem tomadas 'fora do consenso'; quando Siniora concordou em apoiar um tribunal internacional para julgar os assassinos de Hariri os ministros do HA abandoram temporariamente a coalizão, e o governo foi obrigado a fazer novas concessões ao HA.

Como eu já mencionei antes, se livrar de Lahoud e desarmar o HA eram objetivos sinceros dos reformistas, mas a combinação de interferência externa (Siria), desunião (Aoun), e a fraqueza intrinsica do estado libanês, impediram que ambas as coisas ocorressem. Talvez se possa acusar o governo de indecisão. Mas é preciso levar em conta o fantasma paralisante da guerra civil de 75-90. Assim como o Holocausto (para os Israelenses) e a Naqba (para os palestinos) foram catástrofes formativas da identidade nacional, que em boa medida moldaram as visões de mundo de um povo e outro, a guerra civil assombra toda ação (e inação) do governo e lideranças Libanesas. A política libanesa ainda segue estritas linhas sectarias, com o poder divido por lei entre os 14 sectos e nacionalidades que compoem o pais. O que os Libaneses mais
temem é que a cola que une estes grupos díspares se desprenda, e que as inúmeras contendas entre eles, que foram congeladas mas não resolvidas desde 1990, novamente se tornem conflitos abertos, com os paises vizinhos apoiando ora um ora outro lado.

O Hisbollah não é igual a Al Qaeda: ...por uma série de razões, a menos importante das quais é o fato de serem uns fundamentalistas xiitas, e outros fundamentalistas sunitas. O HA é um grupo nativo do Libano, representando e agindo em nome de uma fração considerável dos xiitas libaneses. A AQ é um grupo transnacional (embora com raizes Sauditas e Egipcias), que tenta estabelecer um califado global. E enquanto o HA reconhece alguns limites morais para seus atos (baseado em jurisprudencia xiita tradicional, apimentada por um anti-semitismo crasso e uma pitada de hipocrisia), a AQ tem aquele caracteristico jeitinho niilista de ser psicótico que é só seu. Para ler um texto sobre o assunto escrito por alguem que realmente entende do que está falando, recomendo fortemente este artigo do Martin Kramer.

BTW, o último vídeo do Zwahiri (o #2 na AQ) foi particularmente patético. Além de tentar oportunisticamente se ligar a causa do HA, ele proclama a união da AQ com um outro grupo egipcio (que prontamente negou tal união!). Depois das estripulias do Zarqawi, explodindo procissões de Ashura em Najaf e acusando o HA de ser um agente do zionismo (!) duvido que ele seja levado muito a sério. E é meio wannabe ficar lançando proclamações gravadas em uma caverna erma enquanto o HA ainda tem uma emissora de TV transmitindo, e continua lutando competentemente contra os Israelenses.

A Siria pode usar sua influencia para acabar com o conflito: ...É uma noção dúbia tanto em termos de capacidade como de intenção. Eu já discuti isso em um post anterior, mas eu queria só ressaltar como o Bashir Assad está isolado nesta historia toda. Tanto americanos quanto os israelenses o ignoram completamente. Os franceses preferem falar diretamente com os iranianos; e a liga árabe, na reunião de emergencia que acabou hoje em Beirute, aceitou integralmente os sete pontos do plano proposto pelo Siniora, ignorando as objeções e emendas propostas pelo representante sírio. Este, um tal de Moallem, havia chegado antes das demais delegações, e em reunião com o presidente Lahoud (tipicamente, foi seu único visitante extrangeiro) fez declarações bombásticas apoio à luta contra Israel (algo que a Siria está sempre disposta a apoiar desde que não tenha que efetivamente participar da luta). Ele saiu antecipadamente da reunião, sem dar declarações e vaiado por manifestantes locais. Veja aqui e aqui o que dois Libaneses particularmente bem informados tem a dizer a respeito.


Último comentário. Alguns dos ataques aéreos israelenses me parecem um tanto bizarros. Não por serem moralmente indefensaveis (embora vários tenham sido), mas por não terem nenhuma motivação lógica aparente, e claramente não serem resultado de ignorancia ou descuido. Os ataques esporádicos aos quarteis do exercito libanês, por exemplo. Para quê atacar exatamente a instituição que se espera tome o lugar do HA no sul do Líbano? Ou ainda o ataque ontem a um predio em um bairro de Beirute chamado Shyiia. A região é dominada pelo Amal, o único outre grupo xiita representativo, que será imprecindível na eventual formação de um consenso nacional pós-guerra que marginalize o HA como entidade armada acima da lei. Se alguem conhece algum motivo plausivel para tais ataques, por favor me diga.

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segunda-feira, 7 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(Patrulha da madrugada)

Quando eu trabalho madrugada afora meus habitos alimentares são iguais os de uma mulher grávida. Combinada à ansia de comer coisas bizarras (quanto mais pesado melhor), tenho uma completa falta de saco para preparar algo que não saia direto de uma lata, ou possa ser picado e jogado em uma frigideira rapidamente. (estou craque em picar coisas; antes achava que picar umas cebolas era trabalhoso, hoje pico cebolas, pimentões, descasco alho e fatio bacon a jato sem nem pensar muito) .

O resultado são receitas que cairiam bem no 'Cthulhu's High Fat Content Cookbook'. Como já disse, não me levanto da cadeira se não estou tomado por uma fome avassaladora só aplacavel por algo substancioso. E.g.:

- Leite condensado com canela (Ovomaltine opcional) e noz moscada, esquentado no microondas
- Ovo de codorna com maionese
- Bacon e banana, fritos e temperados com páprica
- Batatas e cebolas assadas, com manteiga (de ervas se estiver com saco)

Mas minha refeição notívaga mais tradicional é a famosa 'fritada *.*', que consiste do que estiver na geladeira temperado com o que me vier a telha. Geralmente inclui cebola e alho. Se disponiveis, também coloco pimentão, tomates, aipo, salsinha, cebolinha e ervas que estiverem a mão. A carne normalmente é bacon, mas também pode ser linguiça, toucinho, ou iscas de qualquer vertebrado infeliz o suficiente para parar na minha geladeira. O tempero pode variar de um curry da hora (cardamono, anis, açafrão, semente de mostarda, coentro, gengibre, feno grego, etc) até um centro-europeu meio mambembe (páprica, erva doce, kummel, etc). Pimenta! Mas o que determina a cara do prato é o que coloco no final. Ovos, para um gosmelete; farinha e ovos para uma farofa; creme de leite para um stranhonoff; manteiga e queijo para sei lá o quê.

O limite é a imaginação. O fundamental é que seja a) pesado, e b) temperado.

Também faço um patê (que inventei quando tinha 7 anos e é conhecido com o 'patê do Bruno' na minha familia do lado de mãe até hoje), que é trivial de fazer (duh! Alguem esperava confit de pato com demi-glacê de framboesas aos 7!?).

=> Em um liquidificador, misture atum, cebola e maionese. Adicione salsa e cebolinha picadas.

Gosto de temperar com pimenta do reino (em grão inteiros) e noz moscada. Eu como litros desse patê com pão ou batata assada.

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Quanto a guerra, ela entrou na fase final. O rearranjo estratégico final vai depender de forma crucial do que acontecer no cenário politico interno do Libano depois do cessar fogo. O grande momento do Nasrallah chegou e passou a cerca de uma semana atras; depois disso a guerra para o HA se tornou uma questão de sobreviver e durar até a ONU impor um cessar fogo. Ao mesmo tempo, é imperativo para o HA provar para o mundo que não está fora de combate. Israel por outro lado não foi capaz de aniquilar o HA, e é improvavel que o faça até o final do conflito.

A coisa pode se complicar novamente se a resolução do conselho de segurança da ONU for lida como uma derrota clara de um dos lados (a última versão que está sendo discutida é bem ruim para o HA, mas não invoca o capítulo 7 da carta, que permite a imposição de sanções). Se o HA se negar a aceitar a resolução (e o governo nominal do Líbano é refem da ameaça implicita de guerra civil), Israel pode querer descarregar o onus moral de ser a parte interessada na continuação do conflito nas costas do Nasrallah, e tentar extender a campanha por mais algumas semanas para obter uma vitoria militar esmagadora. Eu não sei se a 'comunidade internacional'* vai aceitar esta inversão de papeis (porque na verdade é do interesse do HA um fim da guerra para ontem), mas possivelmente isso vai extender o conflito por pelo menos mais uma semana.

O pior cenário é um final inconclusivo, que leve a uma retomada (ou mais provavelmente um replay) do conflito daqui a alguns meses ou anos.

Essencialmente, o que está em jogo nesta guerra é: a) O status final do HA no contexto libanês (taticamente o HA foi moido, mas não arrasado; politicamente é dificil dizer ainda); b) O fator dissuasivo do poderio bélico israelense; e c) A capacidade do Irã de estabelecer sua influencia no mundo árabe. Ainda não há um lado claramente vitorioso, mas o Líbano é claramente o lado perdedor.


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* Adoro a hipocrisia desta expressão. Dá a entender que alguem vai perguntar aos representantes de Malawi ou do Laos o que eles acham da situação.

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sexta-feira, 4 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(Israel-Palestina, [sorry Mafra!])

Mudando só ligeiramente de assunto, abaixo segue um post meu, originalmente no Harry's Place, que fez algum sucesso. O post é uma tentativa de explicar porque eu acho que a formação de um estado independente palestino é um objetivo louvavel, mas os meios usados para atingi-lo foram e são os piores possiveis; e como isso contribuiu para a série de catastrofes pelas quais passou (e passa) o povo palestino. Um tanto petulantemente, eu então listo o que eu acho que a liderança palestina poderia ter feito diferente, com chances muito maiores de sucesso.

I don't pretend this is an easy question. Any list is bound to be simplistic; certainly none of the things I suggest would be easy. But, considering that the accomplishments of the Palestinian national movement these past 60 years have been non-existent, if not negative, they were at least worth a try.

First, historically a Palestinian state could have been created if
a) The 1947 partition plan had been accepted, or even if the principle of partition had been accepted.
b) A Palestinian state could have been created at any time between 48 and 67.

This is history now, a history HP threads have dissected in nanoscopic details multiple times.

Under the present context of being under occupation, Palestinians, or their leaders, might try to:

1) Have a realistic, non genocidal goal. Wiping Israel off the map is neither. Establishing an independent state in the occupied territories is. Work exclusively towards the goal. Ignore revenge, getting even, paying back or pointless venting of anger. Focus on the goal.

2) Act together. Having multiple groups with fractal splintering, often fighting each other, dissipates energy, and makes negotiating with the nominal head of the movement kind of pointless. Having a democratic, or at least consultive, decision-making process helps in this regard.

3) Be credible. When you say you will do or refraing from doing something, follow through. See 1.

4) Act state-like even before you become a country. Start building solid national institutions, competent and non-corrupt, from the begining. Strive to make such institutions a viable alternative to the occupation.

5) Stop terrorism.. Please don't make me explain why.

6) Understand the occupiers. Not as a racist cartoon, but as a bunch of fallible human beings. Most of which have probably more profitable things to da than make your life miserable. Forge alliances with those without any vested interest in the occupation, to undercut its support in the home front.

7) Keep talking. Put forward tangible proposals, and create a national consensus behind them. Follow the letter of any agreement you do sign, and then demand the other side do the same. Acknowledge that the other side also has legitimate core demands, and learn how to diferentiate those from tactical negotiating positions. In the whole process, the more trusted you are the more concessions you are likely to get.

8) Resist occupation. Collectively, unceasingly. And non-violently. Ignore provocation and distractions, and keep focused on the goal. One of the least noticed side effects of suicide bombings is that they excuse the non-suicidal majority from doing anything against occupation.

Really, if the Palestinian violence and genocidal rhetoric were to stop, the conflict would be quite straightforward for most people, including Israelis: A people under occupation whose land is slowly taken away. Statehood would still be a long walk, but at least the Palestinians would be moving in the right direction.

Eu não quero dizer com isso que a culpa de toda a presente situação é exclusivamente dos palestinos. Os Israelenses também são resposáveis, e de fato muitos dos 'conselhos' acima se aplicam igualmente a eles. A diferença é que enquanto as politicas de ocupação e assentamento não trouxeram paz para Israel e são moralmente corrosivas; a 'resisitencia' tal como tem sido feita pelos palestinos é quase uma forma de suicídio nacional.

PS: Um pouco mais da minha petulancia aqui, onde discuto com Israelenses, Libaneses e Palestinos sobre o Holocausto e a Naqba.

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quarta-feira, 2 de agosto de 2006

Casa, Rio de Janeiro
(ainda sobre a guerra)

Alguns comentarios rápidos:

As razões dadas pelo HA para continuar a 'resistencia' depois da retirada israelense: ... São pretextos bem transparentes.

A 1a razão dada é que Israel supostamente continuaria ocupando terra libanesa. As famosas 'Fazendas de Sheeba' são um pedaço minusculo de terra desabitada, que ficava na fronteira entre Siria (nas colinas de Golan) e Libano. Até 1967 eram ocupadas pela Siria, sem qualquer cotroversia aparente. Após a guerra dos 6 dias, passaram a ser ocupadas pelos israelenses. Todos os mapas existentes (alguns da epoca otomana e colonial, outros produzidos pelos governos tanto Sírio quanto Libanês), exceto um de origem considerada duvidosa, indicam que as FdS seriam parte da Siria. Foi isso que a ONU concluiu quando confirmou que a retirada Israelense tinha sido completa.

A coisa parece simples, mas lembre-se que isto é o Oriente Médio. Após 2000, o HA começou a reclamar da 'ocupação' das FdS. Os demais politicos libaneses acabaram repetindo a retorica, com diferentes graus de sinceridade, devido tanto a popularidade quanto a necessidade de incluir HA na coalizão governante. A Siria, que dominava o Libano até o ano passado, tinha uma postura dúbia, de apoiar a luta pela 'libertação' das FdS, ao mesmo tempo em que se recusava a demarcar suas fronteiras com o Líbano.

A segunda justificativa dada pelo HA são os prisioneiros. Este é um assunto espinhoso; durante a ocupação os isralenses e seus aliados do SLA mantinham inumeros prisioneiros libaneses sem nenhum processo judicial e em condições abismais. Mesmo depois de 2000, alguns ainda permaneceram em prisões em Israel. A maior parte foi libertada em troca de 3 soldados israelenses mortos e um 'empresario' (provavelmente um traficante de drogas) vivo, todos sequestrados pelo HA.

O numero restante não é divulgado, mas não é alto. Aparentemente Israel está disposto a troca-los por um aviador que foi derrubado sobre o Libano em 81, e que acredita-se foi capturado ou morto pelo HA ou seus aliados. O HA nunca especificou quais prisioneiros quer ver livres, exceto pelo simpático Samir Kuntar, que em 79 se infiltrou em Israel e matou 3 membros de uma familia e um policial antes de ser preso. O seu retrato figura de forma proeminente nas manifestações do grupo xiita.

No final das contas o Nasrala já indicou que se as FdS forem devolvidas, exitem sempre outras razões para continuar resistindo. Ele já mencionou 7 aldeias, que hoje fazem parte de Israel, mas que tinham maioria xiita até 1948. Certamente ainda tem muita 'Palestina ocupada' (que é como HA se refere a Israel) para ser libertada.

Eu não quero dizer com isso que o HA tem os meios, ou mesmo a intenção, de marchar até Tel Aviv. Mas ele certamente está tentando usando o meme da 'ocupação' (poderoso por razões obvias entre os Arabes) para perpetuar um estado de guerra que objetivamente não serve aos interesses nem de Israel nem do Libano.

Neste sentido, o premiê Libanês propos um plano inteligente. Uma retirada Israelense das FdS seria organizada após as fronteiras serem demarcadas, HA e Israel trocariam prisioneiros; e o HA seria desarmado e uma força internacional ajudaria o exercito Libanes a ocupar o sul do Libano. É uma maneira bem sacada de dar ao HA o que ele diz querer, e tirar do HA o que ele quer realmente. Acho que um acordo eventualmente sera algo deste tipo, mas resta convencer as partes beligerantes.


O presidente Libanes Emille Lahound: ... É uma piada de mau gosto. Ele é um preposto Sírio; a emenda constitucional que extendeu o seu mandato foi o que levou o Rafik Hariri a se posicionar abertamente contra Damasco, o que resultou na sua morte via carro bomba. A enorme reação popular que se seguiu, junto com o apoio dos EUA, França e Arabia Saudita; e a ameaça implicita das tropas americanas junto a fronteira sirio-iraquiana, forçou os Sírios a se retirarem do Líbano. Depois da retirada, os objetivos do governo reformista libanes (liderados por Siniora, esquentando a cadeira para Hariri jr.) eram, em ordem: 1) Se livrar de Lahoud; e 2) Desarmar o HA. Acho que impedir progresso em ambos os casos foi um dos objetivos do HA quando iniciou essa guerra.

No final das contas, Lahound não represente ninguem, não manda em nada, e acha o que o Bashir Assad manda ele achar. Ele é ignorado por todo e qualquer visitante extrangeiro exceto os Sírios e os Iranianos.

A preocupação israelense com os civis libaneses ...é no mínimo insuficiente. Para mim é obvio que Israel não matou aquele monte de crianças em Qana intencionalmente; é algo que é claramente prejudicial para o que eles querem fazer (i.e., continuar a atacar o HA, e fazer os Libaneses se oporem ao HA depois da guerra). Mas também é obvio que os Israelenses não tomaram todo o cuidado que deveriam. Por mais que o HA lance foguetes a partir de locais civis, isso não dá a IDF o direito de atacar toda e qualquer estrutura por perto sem se preocupar com quem está lá dentro. Se você examinar os relatorios diarios apresentados pela IDF, a maior parte dos alvos atacados consiste da chamada 'infraestrutura do terror', i.e., prédios em que se acredita o HA guarda armas ou material de apoio. De fato, atacar um predio, que é fixo, é muito mais fácil do que caçar lança foguetes montados em caminhoes moveis. Mas muitas vezes evidencia muito circunstancial é usada para incluir um predio ou outro nesta categoria. E o fato é que no sul do Libano prédios deste tipo quase certamente terão em seu interior civis que não puderam ou não quiseram escapar para o norte. O Sul do Libano está devastado, e familias inteiras ainda estão sende retiradas de sob os destroços.

A posição da Síria: ... É problematica. Muita gente acha que a Siria é a chave para resolver a situação. A cerca de uma semana eu conclui que em um acordo em que os EUA tirasse Damasco da geladeira diplomatica e Israel abrisse negociações para a devolução das colinas de Golan em troca de um acordo de paz, a Siria poderia demarcar a fronteira libanesa, e sufocar o HA impedindo o fluxo de armas iranianas. Fiquei um tanto decepcionado quando descobri que metade da blogosfera teve a mesma ideia quase simultaneamente...

Mas pensando e lendo mais um pouco, agora acho que essa solução talvez seja problemática, e provavelmente inexequivel. Para começar, exigiria uma mudança de paradigma geopolitica grande demais para um governo totalitário que essencialmente se define a partir de sua oposição virulenta contra Israel. Além disso, é dificel saber qual o preço que Assad jr. vai pedir; muito blogueiros libaneses temem que seja o retorno da influencia síria na politica Libanesa. Se for, o Oriente Médio estará andando em círculos, e os Libaneses estarão andando na prancha de um navio pirata.

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