O Hizbollah e aliados controlam Beirute ocidental. A maior parte da luta ficou por conta dos milicianos do Amal e do 'Partido Social-Nacionalista Sírio'*, lutando contra membros do 'Movimento (do? para? de volta para o?) Futuro', sunita e liderado pelo Hariri jr. O exército libanês, que havia antes tomado uma postura solomonica de não se envolver na briga, parece agora estar ajudando timidamente o 8 de Março, desarmando milicianos sunitas e negociando a rendição de seus redutos.
A coisa toda esta cada vez mais parecida com um golpe de estado, planejado e executado com a competência típica do Hizbollah. Milicianos xiitas rapidamente assumiram o controle das principais vias de acesso à capital(e, em particular, da estrada para o aeroporto de Beirute). Jornais e estações de TV ligados ao governo (e em particular, aos Hariri) foram invadidos (e, em pelo menos dois casos, queimados) e colocadas fora do ar ou circulação. Edifícios do governo e as residências de alguns dos lideres do 14 de Março foram cercadas. Os Sírios demonstram seu talento cômico ao afirmar que os eventos no Líbano são um 'assunto interno' (assunto interno sírio é provavelmente o que eles têm em mente), enquanto o Irã obviamente culpa Israel e os EUA. Os apoiadores do 14 de Março, por outro lado, não parecem estar dispostos a tomar uma atitude mais enérgica em favor de seus protegidos, se estes não parecem dispostos a fazer o mesmo. Deste modo, as reações até agora foram confusas, se resumindo em geral a obviedades diplomáticas e piedosas homilias em favor da paz e reconciliação.
O próximo passo do Hizbollah, segundo a cartilha dos golpes em republiquetas de bananas, seria obviamente assumir o controle do governo, em nome da 'salvação nacional', e começar a prender ou calar seus oponentes. As coisas porém não são tão simples, já que Nasrallah não controla e provavelmente não tem como controlar as áreas maronitas, druzas e sunitas fora de Beirute; e juntas estas isolam os xiitas em três enclaves disjuntos (sul, Beirute ocidental e vale de Bekaa).
O mais curso provável dos acontecimentos daqui em diante, me parece, é um recuo humilhante por parte do 14 de Março em relação aos estopins da crise (movimento já ensaiado ontem por Hariri e Jumblatt), seguido da eleição do General Michel Suleiman* para presidência, e a formação de um governo 'de união nacional' liderados por alguém maleável, e onde o Hizbollah e aliados tenham poder de veto. O governo cessaria a cooperação com o tribunal da ONU que investiga a morte de Hariri, libertaria os quatro generais presos pelo crime (todos com fortes ligações sírias). O Líbano voltaria, em essência, a ser um protetorado de Damasco, onde o Hizbollah poderia fazer o que bem entendesse.
Obviamente, a situação ainda está em fluxo, e tudo pode acontecer (para parafrasear os prognósticos da típica mesa redonda de futebol). Mas se o 14 de Março quer ter alguma influencia no resultado final, é bom que parem de esperar que o resto do mundo envie a cavalaria, e tomem uma atitude (eles poderiam, no mínimo, seguir meus conselhos ;-))
Acredito que a guerra entre Israel e Hizbollah em 2006 deve ser entendida no contexto da briga de poder dentro do Líbano. Instigar seu belicoso vizinho ao sul é uma maneira que o Hizbollah tem de justificar a sua própria existência como uma milicia/partido político/ONG/entreposto persa além do controle ou sanção do estado Libanês. Visto desta forma, o golpe que ocorreu nestes últimos dias é simplesmente a culminação do conflito entre esta visão e o ideal do Líbano como um estado-nação de verdade, regido por leis e protegido por um exército nacional. Se vencer esta batalha, poderemos dizer finalmente que o Hizbollah ganhou a guerra. O Líbano, novamente, terá perdido.
* Um grupo de inspiração nazista que defende a ideia de uma 'Grande Síria', que incluiria o Líbano, a Jordânia, Israel, Palestina, o Sinai (no Egito) e a região em volta de Iskederum (na Turquia). Eles têm a mania de pendurar posteres do Assad jr. (oculista e presidente da Síria nas horas vagas) por onde passam.
** O atual comandante do exército libanês; ele havia sido proposto pelo próprio 14 de Março como um candidato a presidência 'de consenso' (o que no caso queria dizer aceitável para a Síria e o Hizbollah). O 8 de Março bloqueou sua nomeação porque queria também direito a nomear um número suficiente de ministros para ser capaz de bloquear qualquer decisão do governo. Os eventos recentes, porém, aparentemente mostram que Suleiman, mais do que simplesmente 'aceitável', está totalmente do lado da Síria.
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