quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Casa, Belo Horizonte
Está a brincar, Sr. Gell-Mann!

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Considere o arame que prende a rolha em uma garrafa de champagne.

O Gell-Mann é de fato um velhinho muito simpático. Pelo menos foi conosco, estudantes do CSSS. Deu duas palestras no último fim de semana da escola, e, assim como os demais professores, ele e a esposa faziam suas refeições com a gente sem frescuras, e batiam um papo amigável.

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Fechando um dos olhos, e olhando fixamente através do eixo principal, notamos dois círculos concetricos...

Ele agora está semi-aposentado, estudando literalmente o que lhe dá na telha lá em Santa Fé. A sua esposa, apesar de uma primeira impressão um tanto intimidante, também é gente boa. Ela aparentemente é uma costureira/designer de moda de certo renome, e origens aristocráticas. Nos contou sobre quando, por razões convolutas demais para que eu me lembre, ficou encarregada de receber diversos cardeais (e, eventualmente, o Papa) em uma mansão ou algo do gênero na Itália. Os cardeais invariavelmente pediam ou algum tipo de droga (analgésicos e barbitúricos, acho), ou bebida; um deles chegou com uma maleta cheia de dinheiro. Pelo menos nenhum pediu coroinhas...

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... Com alguma concentração, é possível convencer nosso cérebro que o círculo
que na realidade está mais distante está mais próximo.

Humberto, o Gell-Mann continua sim obcecado por etimologia, e com a pronuncia das palavras. Ele não corrigiu o meu português, mas ficou bastante curioso quando eu disse que ele tinha um sotaque carioca (ele não fala português, mas conhece algumas palavras. Alias, ele conhece algumas palavras em todas as línguas conhecidas, incluindo !Kang). Viajamos um pouco ao tentar imaginar a origem das diferenças de pronuncia entre Minas e Rio. Ele também é um observador de pássaros; aprendi mais do que jamais quis saber sobre o Pica-Pau de Magalhães. No penúltimo dia no Edelweiss, eles saíram em excursão ornitológica pelas margens do Nahuel Huapi.

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Convencidos que o círculo mais distante é o mais próximo, rodamos levemente o arame...

Gell-Mann também é um ateu fervoroso. O que não o impede de saber minúcias sobre
diversas religiões. Será que Deus prescinde de causalidade, e age somente de forma auto-consistente? Mas a comida chegou antes que pudessemos responder esta pergunta.

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... o arame vai aparentemente rodar na direção contrária!

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terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Casa, Belo Horizonte
Sobre a arte de encher linguiça


Cheguei vivo e bem ao Brasil, e estou agora em Belo Horizonte, matando saudades da minha família (mas principalmente do Gabriel!). Viajar cansa; mas cuidar de um moleque hiperativo de 2 anos cansa mais. Estive portanto sem muito tempo e/ou energia para postar decentemente nos últimos dias. Tenho um post semi-escrito sobre a volta do Chile, e outro sobre como é jantar com os Gell-Mann; mas acho que vão ficar para depois do Natal. Mas aproveito para postar aqui algumas fotos legais de Bariloche. Subi todas as fotos para o Flickr, para quem tiver interesse e paciência para conferir.

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O sol se pondo visto do Hotel Tuquenlen ilumina o topo da montanha. Existe um impressionante nome multisilábico em alemão para este fenômeno, para quem estiver disposto a procurar no google.

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+ montanhas.

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Um banco de neve que alimenta o lago glacial no refúgio Frey....

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...onde resolvemos dar um mergulho. Os dedos do pé doiam de frio

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Uma geleira no (acho) monte Tronador

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O vulcão Osorno (o nome quer dizer ´onde vive o diabo´) coberto de nuvens, no Chile

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Esta peculiar árvore cresce próximo à fronteira Argentina-Chile. Meus colegas ecólogos na CSSS contam que ela é uma relíquia paleozóica, e de fato não é difícil imaginar uns Ichtyostegas tomando sol por perto . Ela é, de qualquer maneira, muito estranha...

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...ainda mais quando vista de perto. Note como os ramos se penta-furcam simetricamente, perpendiculares ao caule. O padrão se repete fractalmente por mais uma ou duas escalas. Os ramos se afinam após cada pentafurcação, o que é consistente com a preservação da seção reta (o que deixaria o Jeffrey West muito feliz, creio)

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quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Aeropuerto de los Hermanitos del Sur, Buenos Aires, Argentina

Ontem percolei de volta de Port Montt, Chile, até Bariloche. Um passeio muito interessante, envolvendo cidades perdidas no interior chileno, comidas típicas, um elefante, vendedores de algas marinhas, carona com um caminhoneiro de Piracicaba, vulcoes inativos e a volta até Bariloche por uma paisagem de faroese. Nao tenho tempo de postar a historia toda agora, mas escreverei um post novo quando chegar no Brasil e dormir 18 horas.

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terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Pousada da dona Maria, Port Montt, Chile
La garantia

Chegamos em Port Montt depois de 13 horas de barcos e onibus. Devo dizer que depois de algum tempo, o 4a lago glacial, 6o vulcao inativo e 15o bosque de coniferas começaom a perder o charme. Nos encontramos com os demais CSSSeiros que vieram de onibus (um mexicano, um americano, um colombiano e um argenttino, mais duas catalonas que eles agregaram pelo caminho). Na rodoviaria, existem algumas avozinhas simpaticas que oferecem quartos em casas de familia a um preço irrisório; o seu filho/marido/capanga até pega os hospedes na rodoviaria. No nosso caso, a nossa pousada tem internet (quand conseguimos enxotar o pentelho que fica no MSN o dia inteiro), é limpa, e apresenta uma relaçao bijetiva entre o numero de hospedes e o numero de camas. Obviamente, se uma pessoa randomica me oferecesse uma hospedagem em uma casa nao especificada, mediada por uma carona dada por algum fulano, eu chamaria a policia. Mas aparentemente as coisas sao mais relaxadas aqui em Port Montt... Amanha vou ver o mercado de frutos do mar, e pegar o onibus de volta a Bariloche as 10:00.

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segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Hotel Natura, Peulla, Chile
Barreiras alfandegárias



Sai hoje bem de manhã de Bariloche, para fazer Cruce de los lagos até Port Montt no Chile. A ideia é atravessar os Andes de barco usando os lagos glaciares dos dois lados da fronteira, com ônibus ligando um lago ao outro. É um passeio que leva 12 horas ao todo, passando por algumas paisagens bastante espetaculares. Vim com a Yérali, uma venezuelana que também participou do CSSS (e certa vez hospedou o Richard Stallman em Caracas); em Port Montt vamos nos encontrar com outros CSSSeiros que fizeram a rota mais convencional, montanha acima, de ônibus (que tomaremos na volta, amanhã).

A fronteira entre Argentina e Chile por aqui corre exatamente onde as aguas se dividem no Andes. Do lado argentino, elas correm para o Atlântico. Do chileno, para o Pacífico. De ambos os lados, a região é protegida em parques nacionais. Após duas permutações de ônibus e barco, passamos embaixo do Tronador (a maior montanha da região, com uns 3000m de altura), e seguimos por uma trilha em uma rainforest de montanha (sei lá qual o nome disso, mas chove para caramba, e o mato cresce denso). A alfandega/migra é um prédio modesto, mas os chilenos são muito rigorosos a respeito do que deixam entrar no seu país. Spray de cabelo de potência industrial parece ser proibido, porque a diferença entre penteados por aqui e as armaduras capilares usados do lado que deságua no atlântico é radical. Infelizmente, alimentos também são proibidos... Os bastardos confiscaram um salame de cervo defumado que comprei em Bariloche. O chocolate passou, porém.

Paramos por algumas horas em uma cidadezinha chamada Peulla no meio da tal floresta, que tem 300 habitantes, 3^10^9 moscas, e algumas trilhas interessantes. Almoçamos frutos do mar no Natura, que muito civilizadamente tem wifi liberado. Vou tentar subir umas fotos, mas o ônibus que vai até o proximo lago vai chegar logo.

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Hotel Edelweiss
SOS camada de ozônio

Estou aqui na Argentina a apenas 15 dias, mas sinto como se estivesse aqui a meses. Isto se deve, em igual medida, a saudades de casa e ao periplo intelectual que foi este evento.

Nao consegui postar muito nesta ultima semana; nao so' mudamos de hotel (alto nivel, mas com WiFi muito caro), mas entramos em um ritmo de pouco sono e muito trabalho, assistindo as palestras durante o dia, e trabalhando no projeto final durante a noite. Devo dizer que fiquei muito satisfeito com o meu*. A minha apresentaçao foi a ultima; de fato, a penultima palestra do evento. So' quando terminei entendi a magnitude do meu cansaço. No computo geral, foram duas semanas tao intensas quanto gratificantes. Quase todas as aulas foram interessantes, e me fizeram pensar muito. Os professores conversavam e faziam suas refeiçoes conosco (jantei com o Gell-Mann umas 3 vezes), e os meus colegas sao simplesmente fantasticos. Poucas vezes na minha vida encontrei um grupo tao interessante e interessado. Suspeito fortemente que daqui para frente continuaremos a nos esbarrar pelo mundo.

Fora a excursao ao Cerro Catedral (cujas fotos ainda nao postei por falta de tempo e banda), e um passeio pela cidade hoje, nao fiz nenhum turismo digno de nota. Tenho portanto poucas observaçoes, digamos, antropologicas, sobre nossos hermanos do sul. Noto, porem, duas obsessoes locais que sou incapaz de entender: Toques de celuar bizarros (uma voz feminina de taquara rachada gritando 'atende a /&·"%$ do telefone' parece ser particularmente popular), e a quantidade de laque de cabelo (ou agente fixador equivalente) que argentinos e argentinas, especialmente os jovems, usam. Sao mechas (a)lisa(da)s apontando em todas direçoes, ou massas medusicas de cabelos cacheados armados formando uma tenda fractal. Tudo isto se movendo rigidamente juntamente com a cabeça, como em um playmobil. Nao que isto realmente me incomode (bem, os telefones enchem o saco), so' acho curioso. Mas a carne continua fantastica.

Amanha saio daqui, e por falta de uma sequencia factivel de vôos, so volto ao Brazil no dia 16. Aproveitarei para dar um pulinho no Chile, atravessando os lagos glaciais e passos andinos ate' o oceano Pacifico, em Puerto Mont. Volto no dia seguinte, direto para o aeroporto, e de la' para o Brasil. E chega de viajar. Este ano.

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* Fiz parte de um grupo quadrinacional (Brazil, EUA, China e Uruguai), estudando a memoria associativa sequencial do sistema olfativo; obtivemos alguns resultados interessantes com nosso modelp, e consegui elaborar um toy model muito legal que pode ser iterado com papel e caneta, mas retém algumas caracteristicas essenciais do sistema real; ele consegue reconhecer 'cheiros' (codificados na forma de vetores binarios de neuronios ativados/nao ativados), reconhecer quando um cheiro e' trocado pro outro, e reconhecer sequencialmente uma combinaçao de cheiros=

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terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Hotel Tunquelen, Bariloche
Carne afinal!!!



Os organizadores do encontro, provavelmente com medo do meu olhar carnívoro cada vez menos discriminante, organizaram um churrasco este sábado. Curiosamente, descobri (ao tentar pedir carne sangrando em portunhol) que o churrasqueiro é escocês! Não sei bem como um cozinheiro da terra dos Haggis veio parar na argentina (embora aparentemente existe mulher na história), mas o cara sabia o que fazia. Na foto, estou degustando uma singela perna de cordeiro, como hors d'ouvre antes do bife de chorizo. Hmmmm.....

Domingo foi nosso dia livre; resolvemos subir o Cerro Catedral até um lago Glacial, a 1800 m de altura (depois subo umas fotos). Foram 10km subindo, 10km decendo. Passei o dia com com bolhas no pés e o andar hesitante de uma velha. E não poderia estar mais feliz.

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sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Hotel Tunquelen, Bariloche
Argentina Vegetariana

A vista da minha janela

Cheguei em Bariloche, para a Complex Systems Summer School. É um evento aparentemente bem financiado (por um milionário boa gente, dizem) organizado pelo Santa Fé institute. Tudo pago (avião, comida, hotel), em um hotel na beira do lago Nahuel Huapi. A escola é bastante intensa, e a idéia é que os aluno (35) interajam om os professores intensamente.

O que me fazia salivar no Brasil, porém, era a carne... Carne argentina... Eu estava antecipando a semanas viver unicamente de proteína animal bovina e coca cola. E, de forma promissora, o hotel é razoavelmente chique; as refeições são servidas à francesa, com pão, entrada, prato principal e sobremesa... Mas até agora, neca de carne. Estamos nos aproximando assimptoticamente de um bife de chorizo; começamos com um risoto vegetariano, passamos para peixe, frango, e finalmente (hoje) carne de porco. Esperamos ansiosamente o almoço amanhã; mas por segurança já estamos nos organizando para comprar carne na cidade e fazer um churrasco neste fim de semana.


São quatro aulas de 1:30 horas por dia. Já tivemos alguns professores excelentes, e bastante conhecidos (Liz Bradley, James Crutchfield, Geoffrey West, etc). No final, devemos apresentar um trabalho final (em grupo). Estamos trabalhando com a interação entre o bulbo olfativo e o cortex. Não sei exatamente o que vamos fazer ainda, mas estou com diversas idéias. Mas vai dar trabalho.

Ainda não fui em Bariloche. O hotel fica a 20 km da cidade. No domingo, vamos fazer uma caminhada de 9 horas até um lugar chamado Lagoa Negra. Vai ser a primeira vez que saio do hotel.

Estou postando de um luau com WiFi, debaixo de um céu cheio de estrelas. Estou com meu binóculo, revivendo meus dias de monitor na Serra da Piedade, e mostrando para os meus colegas as luas de Júpiter, a nebulosa de Órion, o aglomerado globular 47 Tucanea e as Pleiades... vida dura...


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segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Voo 2870, algum lugar sobre o norte da Patagônia
Complicações e Complexidade

No último capítulo do Milliways Lounge Adventure Hour (patrocinado por Nu-down, o protetor solar anti neutrinos*), nosso heroi estava se preparando ir de Philladelphia até Nova York, pegar uma encomenda na ponto norte de Manhattan, e ainda chegar a tempo de pegar o seu vôo de volta para o Brasil. Pois bem; depois de usar quase todo tipo de transporte motorizado terrestre inventado pelo homem (trolley, ônibus, taxi, metrô e trem), conseguir de alguma forma enfiar um PS3 e seus diversos acessórios e penduricalhos na mochila, cheguei no JFK 30 minutos antes do meu vôo partir. Desta vez a sorte não foi camarada, e perdi o dito cujo. Mas consegui embarcar no próximo.

Mal cheguei no Brasil, e e já estou viajando novamente. Estou agora a caminho de Bariloche para a 'Complex Systems Summer School'. Enquanto eu estava nos EUA, a Ceci heroicamente efetuou a mudança (para um outro apartamento, também no Leblon. Loonga história...); cheguei já no apartamento novo, que ainda estava um caos de caixas, livros e roupas espalhados por todos os comodos. Para não dar a Ceci a satisfação de achar que ela é a única que rala nesta família (enquanto eu supostamente fico flanando mundo afora), e dando continuidade à minha tradição de fazer tudo no último segundo possível da última hora inadiável, ontem, após cuidar do Gabriel pela maior parte da manhã, passei o dia de furadeira e martelo na mão. Montei armários,
estantes, prateleiras (estas últímas com a ajuda inestimável do André), e tudo o
mais que Deus colocou nesta terra generosa que possa ser pregado ou encostado em uma parede. Terminamos já de noite, e fomos (eu, André e Naira, já que a Ceci dormia) no Azumi, um japonês hardcore em Copacabana. No final das contas, cheguei em casa 2:30 da manhã, para arrumar a mala, e pegar um taxi até o aeroporto, de onde meu vôo sairia as 7:00...

Estava me sentindo ótimo no avião. Buenos Aires é uma cidade tão geométrica, acho que zzzzzzzzzz....

Acordei com o serviço de bordo, e fiquei alternando surtos de atividade com sonos súbitos, quase catalépticos. Entre cochilos involuntários, notei o seguinte: Do ar, a a Argentina antes dos Andes é extremamente plana, sem muitos cursos d'água visíveis, e com poucas árvores. O terreno é dividido em um padrão abstrato de (suponho) plantações retangulares multicoloridas, margeadas por estradas tronicas formadas por segmentos de retas. A medida que os Andes se aproximam, a planice começa a ser cortada pelo que só posso descrever como estrias, com terreno irregular pontuado de pequenos lagos (muitos deles secos ou quase). O verde só aparece quando estamos chegando em Bariloche, quando os Andes já são visíveis com seus cumes (no momento, esparsamente) nevados. A vegetação aqui em baixo parece ser luxuriante, e o terreno é bastante irregular. Mas aí a aeromoça passa falando para desligar aparelhos eletrônicos. Quando chegar lá em baixo, subo este post.

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* Você sabia que a cada segundo, o seu corpo é atravessado por bilhões de insidiosas partículas subatômicas chamadas neutrinos? Você sabia que neutrinos podem transformar núcleos estáveis em perigosos isótopos radioativos? Proteja você e sua família com nu-down, o novo produto da WD Corp! Só nu-down proteje contra os três tipos de neutrinos conhecidos, sem engordar ou manchar a pele. Quanto você pagaria por este fantástico produto? Não responda agora, porque você ainda leva, inteiramente grátis, o WD Ground State Estabilazator, que previne o decaimento de falsos-vácuos meta-estáveis e queda de cabelos. Mais um produto com a qualidade WD Corp!

AVISO: Pode causar decaimento beta. Consulte o seu físico de partículas se persistirem os sintomas. As constantes de acoplamento podem sofrer pequenas variações em certas escalas de energia, e não nescessariamente corresponderão aos valores indicados na embalagem.

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sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Ap. do Gary, Philladelphia
Passando frio em Valley Forge


Philladelphia (Philly para os íntimos) fica a meio caminho entre Washington e Nova York. É uma cidade histórica (para os padrões deste hemisfério) bastante simpática, que decidi visitar no meu caminho de volta. Fico aqui somente um dia, couchsurfing na casa de um abnegado neurocientista local.

A uns 35km de distância, em 1777-78 no chamado Valley Forge, George Washington acampou com seu exército durante um inverno particularmente rigoroso. Um décimo de seus soldados morreu, de doenças várias, gangrena e fatiga. Atualmente, existe uma trilha de bicicleta que vai de Philly até Valley Forge, margeando um rio de nome impronunciável (o Schuylkill). Em julho, bicicletei de Paris até Versailles; resolvi repetir o programa por aqui. Mal sabia eu que minha experiência em Valley Forge seria muito mais historicamente fidedigna que eu esperava.

Saí de Philly sem grandes problemas. Como eu disse, é uma cidade bastante agradável.


A trilha é variada, e é interrompida em alguns lugares. Obviamente, se tratando de um dos meus passeios, fiquei perdido; epicamente perdido às vezes. Logo no começo, saí por uma tangente da ciclovia, e comecei a subir uma colina. Lugar peculiar para uma trilha que margeia um rio, pensei. Comecei a passar por algumas casas conjugadas bastante dilapidadas, em um bairro habitado principalmente por negros, que parece ter sido particularmente atingido pela crise econômica (várias casas estavam a venda ou abandonadas). Com medo de acabar em Delaware, e certo de que havia perdido a trilha, fui perguntando pela 'bike trail' e por 'Valley Forge' para os um tanto incrédulos locais. Seguindo indicações (os incrédulos locais se transformavam rapidamente em simpáticos locais), passei pelo cemitério histórico em Laurel Hill, até achar o rio novamente. Existem várias outras trilhas pela região, que gostaria de explorar um dia.

Uma das trilhas passa em baixo desta ponte

Finalmente, cheguei na famosa cidade de Maynayunk, onde a trilha efetivamente começa (coincidentemente, mais tarde fui jantar com o Alexandre e a Flávia, e eles me levaram para um restaurante literalmente ao lado da entrada para a trilha).


A partir deste ponto, a trilha segue primeiro ao longo de um antigo towpath (usados para puxar balsas canal acima), e em seguida entre o Schuylkill e a ferrovia que tornou o tal towpath obsoleto. Ela é ladeada por árvores, agora totalmente desfolhadas: Um efeito que acho ao mesmo tempo muito bonito e um tanto sinistro.


Falando em sinistro, passei ao lado de algumas casas em ruínas perdidas dentro do mato. Esta é uma das regiões mais antigas dos EUA, mas a área específica onde eu estava nunca foi densamente ocupada, então é possível encontrar, se procurarmos com cuidado, aquele sutil palimpseto de evidência quase esquecida de ocupação humana (?) ao longo dos séculos. < .Lovecraftian prose> Que horrores antedeluvianos se escondem por sob as ruínas esquecidas da Pensylvannia? O que tramam as insanidades rastejantes que se banqueteiam dos putrescentes restos de seus antigos habitantes? < \ Lovecraftian prose >

Yä Yä Shubb Niggurath, dizia o grafite

The Manayunk Witch Project

Casas abandonadas não eram a única atração, porém. Uma região habitada a tanto tempo geralmente tem vários e pitorescos cemitérios.

Notem o nome na sepultura. Começou a nevar pouco depois que tirei esta foto

Após umas 5 milhas, as redondezas da trilha começam a ficar mais habitadas. Entrei no que provavelmente seria chamado de Middle America, com casas de madeira de dois andares, bandeiras americanas penduradas, e decoração de thanksgiving. Mas, exceto por alguns fanáticos fazendo cooper, não havia ninguém nas ruas. Mais a frente, parei na peculiarmente nomeada cidade de Conshohocken, onde comi uma pizza bastante decente (em bar/restaurante chamado Pepperoncini, cuja simpática garçonete Lauren mantém um site sobre bambolês nas horas vagas; talvez devido aos imigrantes italianos, a pizza em Philly costuma ser de massa fina).

Entrei em seguida no maravilhoso mundo do subúrbio, a lá Desperate Housewives. Ao longe, via grandes casas, SUVs, jardins gramados e alamedas; mas a trilha passava ao lado daquelas enormes lojas (supermercados, coisas para a casa, livros), acessíveis somente de carro (não era estritamente no meu caminho, mas eu fiquei perdido novamente). Voltei para o rio, e as lojas deram lugar a garagens de caminhões e industria leve, e muito mato.

Muito mato

Mais mato

Um pouco além, já estava em uma zona quase rural. Agora nevava bastante; eu estava atrasado, e ameaçava escurecer; mas ia chegar em Valley Forge ou morrer tentando (a cova estava até pronta, aparentemente). As últimas 5 milhas foram pura agonia, com vento, neve, as pernas doendo, um frio de rachar e a neve lentamente derretendo e molhando minha roupa. Cheguei em Valley Forge com o Sol se pondo. O parque realmente é bonito, mas não há nada de particularmente notável no museu. Mas sinceramente, este é um daqueles casos onde a viagem vale a pena pelo caminho muito mais que pelo destino.

Valley Forge: George Washington acampou aqui

Valley Forge: George Washington cortou uma cerejeira com esta espada. Ou algo assim.


Passei rapidaemente pelo museu, comprei uma camiseta (que não diz, mas devia dizer 'I rode to Valley Forge in nut-freezing weather and all I got was this lousy T-shirt'). Já estava escuro quando saí de lá (eles estavam fechando, de qualquer maneira). Felizmente um dos atendentes do museu também estava de bicicleta, e tive companhia para voltar até uma área razoavelmente iluminada.

Valley Forge: Frio em 1778, frio em 2008

Não precisei fazer o caminho todo de volta; a cerca de 4 milhas de VF há uma estação de trem; voltei para Philly e pedalei até a casa do Gary (não sem antes confundir sua rua com a paralela, e tentar por alugns minutos abrir a porta de uma casa quase idêntica com o mesmo número; felizmente ninguém chamou a polícia). Mais tarde, com as pernas bambas, fui jantar com o Alexandre e a (extremamente grávida) Flávia. Uma maneira muito bacana de terminar a noite. Amanhã volto para o Brasil, se conseguir pegar o ônibus para NY, passar no Ap do Alex para pegar o PS3 do meu irmão, e chegar no JFK a tempo. Isso sim é viver perigosamente.

Cedar avenue: Where the scientists roam

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terça-feira, 18 de novembro de 2008

Washington Convention Center, Washington
Jabuticaba e Angu

Bambu no café, bambu no almoço, bambu no jantar

Comi Jabuticaba aqui em Washington. Jabuticaba e angu. Aaa, e fui no zoológico também.

O zoológico daqui é muito bem bolado. As jaulas ficam bem integradas no ambiente; e tanto em tamanho como em aparência, não têm aquele ar de Lyubyanka para animais (a lá George Orwell), típico de muitos zoológicos brasileiros. Foi interessante ver as elefantas sendo exercitadas, os pandas na sua coceba comedora de bambu habitual, e os polvos sendo alimentados. Alias, a ala de invertebrados provavelmente é a mais interessante; tive conversas bastante interessantes com os tratadores destes últimos.

Exercício


Fearful simmetry


O Polvo, unido

Perto da saida, existe uma exposição sobre a 'rainforest', com um tanque com pirarucús, pacus e bagres, e uma estufa com uma micro-floresta tropical (que, devo dizer, me parece mais a floresta da tijuca que a amazônia), com aves, macacos, e... uma Jabuticabeira! Com um pouco de incentivo, uma delas acidentalmente caiu da árvore; tive que come-la para não desperdiçar. Não sei como conseguiram fazer uma jabuticabeira crescer por aqui, mas tive que passar pelo keepers responsáveis para dar os parabéns. Parece que a dita cuja tem alguns anos de idade, e este é o primeiro ano que ela deu frutos.

Pirarucús...

... e jabuticabas.

Voltei andando margeando um riacho chamado Rock Creek, onde antes existia um ceminterio usado pelos negros da cidade. Até o começo do seculo XX a área em volta era um tanto erma, até que foi construida uma ponte caríssima, na época chamada de 'million dollar bridge', sobre o rio. Subi até a ponte, peguei o metrô, e voltei para o congresso.

Million-dollar bridge sobre Rock Creek

As apresentações hoje foram mais interessantes do que ontem, e incluiram uma alemã falando de ratos mutantes com comportamento sexual invertido (i.e., machos e femeas com papeis trocados). Mas ainda sofro com a sopa de letrinhas, principalmente quando o assunto toca a bioquímica. Após um 'social' meio choco, fui me encontrar com o meu novo host, um americano que fala portugues fluente. Fomos jantar em um restaurante meio indefínível, com um serviço bastante simpático. Comi o que dizem ser um prato tradicional de Washington, a tal Crab Cake. Ela veio acompanhada de um angú de milho branco (do tipo que usamos para fazer canjica). Muito bom... Apesar de ter comido várias refeições mediocres aqui nos EUA, mais que ocasionalmente a culinária e produtos locais têm me surpreendido positivamente.

Para terminar, e falando em Lyubyanka, a visita noturna ao Spy Museum foi interessante; mas o museu é pop demais para o meu gosto, embora algumas das exposições interativas sejam bastante interessantes. Infelizmente, fotografias não são permitidas; no lobby de entrada existe, pendurada em um guincho, uma estátua do Felix Dzerzhinsky, o fundador da KGB (então chamada de Cheka). A original ficava na frente da sede da KGB, na tal praça Lyubyanka. Depois que a União Sovietica foi para o saco, foi a primeira estátua a ser derrubada em Moscou.

Hang in there Felix

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domingo, 16 de novembro de 2008

Hotel Grand Hyatt, Washington
AC em DC

WiFi é abundante em DC; mas demorei para achar algum lugar dotado de tomada para recarregar o laptop. O WiFi aqui é a princípio para hospedes; mas felizmente está ocorrendo aqui neste hotel um evento paralelo do Neuroscience; não estou participando de modo algum, mas o meu crachá foi suficiente para filar a conexão e tomada.

Hoje não havia nada de particularmente interessante na conferência de manhã. Então, depois dos últimos dias, decidi dormir. Dez horas depois, o Anthony me deu uma carona até o Smithsonian. A idéia, como sempre, era ficar umas duas horas, ver as coisas mais interessantes, e voltar para a conferência. Porém, a minha relação com espaçonaves, sondas espaciais e caças da 2a guerra é semelhante à que tenho com dinossauros...

Depois de ser enxotado para fora do museu após a hora do fechamento, fui andando até o capitólio. Assim como todo apartamento em Paris tem vista para a torre Eiffel, e os do Rio tem vista para o Cristo, nos filmes o Capitólio sempre aparece para indicar que a ação se passa em DC... E sempre mostram só a cúpula do Capítólio. A razão é simples. A cúpula é elegante e bem proporcionada. O prédio embaixo é um bloco de tijolos sem charme nenhum.

Washington compartilha com Brasilia e outras capitais e cidades planejadas o fato de não ter uma personalidade bem definida. Boa parte dos habitantes não nasceu aqui (são funcionarios do governo ou estudantes), e não há aquele tipo de vizinhança charmosa que surge expontaneamente naturalmente em NY ou São Paulo. Os lugares interessantes existem, mas não uma região onde é possível sair andando a esmo e esbarrando em lugares/coisas/pessoas interessantes.



De qualquer maneira, depois escrevo mais, pq agora vou a uma recepção no 'Spy Museum' (fundado por um cara que saiu da CIA para virar curador), patrocinado por uma empresa fabricante de equipamentos de laboratório...

I come in peace

The eagle had landed... O módulo é real, foi contruido para testes mas nunca usado porque o teste anterior havia obtido sucesso total.

Giant leap and all that. As roupas foram usadas em treinamento, já que as originais ficaram no módulo lunar

O módulo de reentrada. A única parte da apolo (fora, se tudo der certo, os astronautas), que volta para Terra

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