Hotel Amerian, Puerto Iguazu
Érre xê
Ontem, terminado o congresso, eu e a Mari (da Física/UFMG) alugamos um carro para uma excurção mercosúlica. A ideia era passar por várias ruinas Jesuitas, na Argentina e Paraguay, e voltar hoje. Para uma viagem organizada as pressas, consegui elaborar um roteiro bastante detalhado, e li bastante sobre a história das missões jesuítas. A única coisa que não fiz foi verificar quais os procedimentos de entrada na Argentina. Mercosul, pais irmão e tal, me lembro de decidir levar só a carteira de motorista, e não o passaporte ('levo a carteira de motorista, e corro menos risco no Paraguai...' - pensei). Depois de uma pequena celeuma desinteressante com a administração do hotel do congresso, fomos ao aeroporto e pegamos o carro. Tudo verificado, atravessamos a fronteira. Para dirigir além de Puerto Iguazu, me informaram, era preciso solicitar um 'permisso' na alfândega. Solicitei, portanto, o permisso. Entreguei os documentos do carro e minha carteira de motorista. "Ond essta seu érre xê?" - me perguntou a policial argentina. "Na parte de baixo do documento em suas mãos" - respondi. "Naao, carteera de mótorissta naao vale. Só o érre xê". Alguma iterações deste discussão depois, finalmente consegui entender que, sem meu documento de RG ou meu passaporte, eu não poderia ir além de Puerto Iguazu. Saco. Saco ao quadrado. Saco^Saco. Eu tenho que dizer que passei algum tempo me sentindo (e agindo) como uma criança para quem o natal não veio.
No final, o dia se acertou. Trombamos com outros três colegas expatriados na churrascaria em que almoçamos, e fomos todos juntos nas cataratas do lado argentino, onde eu passei de barco (e me enxarquei) praticamente embaixo das quedas d'água. (dois dias antes eu já havia ido a margem brasileira). São dois passeios que valem a pena; no lado Brasileiro pela vista (pense na vista do Rio, a partir de Niteroi), e do lado Argentino pela proximidade quase visceral com a torrente de água, de cima e de baixo.
O barco parte de uma pequena e tranquila praia fluvial, no final de uma trilha pela selva. Inicialmente ele vai muito rápido, desviando de eventuais rochas semi-submersas, em um rio canalizado entre dois barrancos tão altos quanto ele é largo. As cataratas começam com um murmúrio, que vai ficando mais alto enquanto elas primeiro aparecem, distantes a frente, e depois crescem e continuam a crescer impossivelmente altas e barulhentas. Quando formam um paredão de agua e pedra ao nosso lado, o barco começa a ter dificuldades em vencer a correnteza. Na entrada da garganta, o gradiente da superfície líquida já é notável; o barco tem que praticamente subir uma colina de agua escoente. Lá dentro, estamos imersos em uma chuva estacionária lançada pelos gaisers produzidos pela água que cai espalhafatosamente sobre as pedras e sobre o rio. Subimos e descemos em cima de ondas um tanto incoerentes, que se propagam de um lado para outro, indecisas*.
Depois de um espaço de tempo indefinível, eu estava em outro cais, enxarcado até os ossos, e com uma trilha a minha frente levando até o topo das cataratas, onde reencontrei meus amigos. Saimos do parque a noite; eu e Mariana para caçar algum lugar para ficar em Puerto Iguazu (e não em Santo Ignacio...), e os outros de volta para o Brasil.
Foi, no final das contas, uma viagem interessante, principalmente pelas companhias, planejadas e extemporâneas. Mas da próxima vez que eu vier a Foz, farei o meu roteiro jesuita. Com meu érre xê.
* Repare que o volume da agua não tem dificulde em encontrar o seu caminho para sair da garganta. É o momento linear transmitido pelas ondas, ou pelo menos aquele associado aos seus comprimentos de onda mais longos, que têm dificuldade de enxergar a saida.
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