segunda-feira, 6 de junho de 2011

Centro de Convenções Rafain, Foz do Iguaçu
Barreiras culturais



Físicos e biólogos, mesmo quando discutem o mesmo assunto, parecem não só pertencer a disciplinas distintas como habitar planetas diferentes. Em se tratando de modelos que procuram explicar fenômenos biológicos, físicos procuram obter grandes sínteses e elaboram teorias matematicamente elegantes mas de aplicabilidade as vezes dúbia; enquanto biólogos analizam detalhadamente cada sistema e produzem classificações e taxonomias barrocamente detalhadas de seus componentes, que descrevem muito mas prevêem muito pouco.

O parágrafo acima é o começo do anúncio de uma palestras que dei no departamento de física da UFMG na sexta passada, para um plateia mixta de físicos e biólogos. O que mostra que eu não hesito em reciclar textos usados, ou possivelmente ofender a minha audiencia. Mas o que é ofensivo nem sempre é falso; de fato, o contrário é provavelmente mais comum. As diferentes atitudes das duas comunidades científicas referentes a sistematização do conhecimento vêm, obviamente, das diferenças entre seus respectivos objetos de estudo, e o reconhecimento pragmático daquilo que historicamente foi bem sucedido. Mas eu sou um físico trabalhando entre biólogos. Mesmo quem mora no estrangeiro a anos ainda se surpreende com os hábitos locais ocasionalmente. Da mesma forma, para mim, o choque cultural ainda é algo sempre presente. Eu falo a lingua deles com mais desenvoltura agora, mas nunca vou perder o meu sotaque.

No primeiros seminários que dei na biologia, o choque cultural foi mútuo. Da primeira vez, fui falar sobre leis de escala e invariância por escala. 'Vamos começar com uma matemática levinha' - pensei - 'assim eles vão se acostumando'. Na segunda equação, a minha plateia já trocava olhares assustados; alguns slides depois, os olhares se dividiam entre semi-catatônicos e exasperados. Eu demorei algum tempo até conseguir explicar alguns dos conceitos que eu acho tão fascinantes de forma que eles ao mesmo tempo entedessem, e considerassem relevante. Ao mesmo tempo eu não sabia nada de biologia. Eu conhecia diversos termos, claro, e era até bastante familiar com alguns dos conceitos centrais. Mas era preciso me levar pela mão para que eu fosse capaz de produzir algo aplicável. Eu era uma espécie de artilharia de sítio matemática, a ser empurrado até os muros de algum bastião inimigo mais problemático para abrir caminho para tropas amigas.

As poucos a comunicação foi ficando mai fácil; assim como duas espécies acopladas biologicamente, o físico e os biólogos evoluiram até se adaptarem uns aos outros. A minha matemática, se não é completamente entendida, pelo menos é mais bem aceita; trabalho agora com dois alunos de biologia que não só são extremamente proficientes em programaçao, mas também me acompanham em minhas elocubrações sobre redes neuronais. E quando peguei a minha chefe rabiscando equações no caderno durante uma palestra que (supostamente) assistíamos, quase pensei 'my task here is complete'.

Em vista disto, dar uma palestra na física foi quase como voltar para casa. Uma audiência que não acha que matriz simétrica é um filme com o Keanu Reeves. Pessoas que encaravam equações como algo natural; ocasionalmente eu ficava reflexivamente esperando uma reação adversa perante alguma manipulação matricial menos trivial... E ninguem parecia particularmente alarmado! Por outro lado, eu já havia me acostumado a falar sobre axônios, oligodendrócitos e colunas funcionais corticais sem ter que dar maiores explicação; mas desta vez tinha que me dar conta que a minha nova audiência talvez nunca tivesse ouvido estes termos.

De qualquer forma, a palestra correu bem (a menos de um ligeiro estouro do tempo e um final de seminário dito no estilo Eneas). É uma familia interessante de modelos neuronais. Em um deles, eu faço uma soma de todos os caminhos fechados que passam por cada neurônio, associando uma fase a cada ciclo de modo que ciclos sîncronos sejam somados construtivamente.

Estou agora em Foz do Iguaçu, usando o meu chapeu de cosmólogo. Esta ocorrendo uma espécie de congresso de congressos das várias áreas da física brasileira. O encontro está sendo excelente, bem organizado e com trabalhos muito interessantes. Depois escrevo mais; estou com planos para um excursão paraguaia um tanto inortodoxo.

2 comentários:

Zecao disse...

Super Bruno, no segundo parágrafo corrija a palavra estrangeiro.

Aki, tem como vc mandar depois o ppt da sua apresentação na fisica. Quando eu encontrar c/ vc no chat vou lembrar. Abração

|3run0 disse...

Argh!!! Cara, as vezes a minha ortografia é de sangrar o ouvido.