domingo, 26 de julho de 2009

Casa, Rio de Janeiro
39.1 C, Apocalipse XII e sarcófagos apertados

Estou de volta ao Brasil. Cheguei na quarta de manhã, e em poucos dias peguei uma gripe sinistra (mas não suína, aparentemente). Passei de indisposto na 5a, para mal na 6a, pré-febril no sábado e febril no domingo (hoje). Espero que esta progressão pare logo...

Viajar é bom, mas eu estava com muita saudade da minha família. Um mês é tempo demais...

O meu último dia na França foi uma sequência de viagens de volta: De Pontorson de volta à Caen, de Caen de volta à Paris, da Gare Saint-Lazare de volta à casa da Jacqueline, da casa da Jacqueline de volta ao aeroporto, e de Paris de volta para o Rio. De forma bem pouco característica, fiz todas as conexões com tempo de sobra, e ainda consegui fazer um pouco de turismo de úttima hora. Em Pontorson andei de bicicleta pela cidade, e tomei um lauto café da manhã em um hotel mais arrumado*. Os Hill vieram buscar a bicicleta exatamente no horário combinado, e peguei meu trem para Caen.

Em Caen, visitei rapidamente o castelo ducal de Guilherme, o Conquistador. Na sua época, era um dos mais fortes castelos da Europa, e hoje guarda em seu interior um profusão de museus e cafés. O destaque não óbvio fica por conta da série de esculturas de animais fantásticos colocados em pilastras de madeira (dependendo do meu humor, posso compará-los ao 'Livro dos seres imaginários', do Borges, ou ao Monster's Manual, do AD&D).

Fui também na igreja de Saint-Pierre, construida entre os seculos XIII e XVI, e incorporando elementos de todos os períodos do gótico normando. Ela serviu de refúgio para o Caenenses quando os aliados trituraram a cidade tentando desalojar os alemães em 1944 (a torre, bastante famosa, foi destruida pela artilharia, e reconstruida décadas depois). Existem pequenos detalhes arquitetonicos interessantes em número grande demais para descrever (fotos aqui), mas eu gostaria de chamar a atenção para um vitral bastante recente (década de 1950), comemorando dois religiosos mortos no bombardeio 1944. Uma moça, carregando um cálice e um cruz, e cercada de estrelas e com a lua aos pés, é atacada por um criatura medonha de 7 cabeças. A situação parece desesperada, e a primeira vista o vitral parece sombrio e pessimista.

Mas no topo da imagem, aparece o número 12, e trombetas. O vitral se refere à Apocalipse XII, e a senhorita é a mãe do cristo renascido (representado pelo cálice), que passou 3 anos e meio no deserto perseguida pela criatura. O que está a ponto de acontecer logo em seguida é a chegada do Arcanjo Miguel (sobre quem aprendi um pouco em Mont Saint-Michel), que vai descer o sarrafo no tal bicho de sete cabeças. Longe de representar a desesperança, o vitral mostra que mesmo quando a situação parece desesperada a salvação pode estar a caminho. Ele se refere não só à profecia bíblica, mas também a ocupação nazista da França. Que durou pouco menos que 4 anos, e na época parecia que duraria para sempre. Mas em 6 de Junho de 1944, as trombetas soaram, e os aliados desembarcaram nas praias a poucos quilometros de Caen. O arcanjo havia chegado, finalmente**.

Não tive tempo de visitar o túmulo do Guilherme na Abbaye-aux-Hommes, mas sei que ele morreu na França, e e não só estava muito gordo na ocasião, mas também passou um bom tempo cozinhando entre a morte e o enterro. Durante a cerimonia, os bispos descobriram, consternados, que o defunto não cabia no seu sarcófago. Tentaram então fazer uma forcinha para ver se entrava no tranco, e como consequência o seu abdomem se rompeu e a capela foi tomada por fedor pestilento indescritível.


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* Le Montgomery, a antiga residência dos condes de Montgomery, para onde o último deles se retirou após matar o rei da França acidentalmente em um torneio. Ele se converteu ao protestantismo, fugiu do pais, voltou, comandou uma insurreição, foi capturado e executado. Recomendo em particular a geleia caseira.

** Interpretação alternativa: A besta do apocalipse atira shurukiens contra a mãe do cristo, mas esta desvia habilmente de todas, enquanto calmamente bebe seu chá no cálice sagrado. Enquanto as trombetas tocam sua musica-tema, ela diz: 'agora você vai experimentar a fúria da técnica xaolin do bastão com cruz!'

2 comentários:

Viuvas do Rafael Cury disse...

Sinto lhe informar mas tanto tempo passado em Caen e voce perdeu a visita do memorial da Guerra, interessantissimo... Vai ter que voltar outra vez.

|3run0 disse...

Eu na verdade passei bem pouco tempo em Caen... para visitar a cidade mesmo tive só algumas horas entre meu trem de Pontorson e o trem para Paris. E tive uma tarde e uma noite para pedalar até e pelas praias.

Mas eu quero voltar sim. Fora o memorial, tb quero ir em Bayeux, por exemplo, e nas praias americanas.