Laboratório de Neuroanatomia Comparada da UFRJ, Rio de Janeiro
Brainjuice II
Finalmente comecei o meu posdoc para valer. Já vim ontem, e estou hoje, aqui no laboratório, tendo a Su como chefe. Até agora estou adorando a experiência. Por dentro, o laboratório tem uma aparência enganadoramente caseira, com uma pia, bebedouro, duas geladeiras, e diversos cérebros e partes de cérebros em formol, em recipientes empilhados como picles na estante. Parece, a primeira vista, uma cozinha; como veremos, a analogia culinária pode ser extendida um pouco mais.
Em um post anterior já falei um pouco sobre o trabalho que estamos fazendo. Essencialmente, eu estou aqui para elaborar modelos teóricos da construção de cérebros de mamíferos, baseados nos dados obtidos no laboratório (não, isto não tem nada a ver com minha tese de doutorado. Ou mestrado. Ou com minha graduação. Ou com o COLTEC. Eu gosto de novidades...). Porém, para não correr o risco de ficar falando sobre vacas esféricas, decidimos que hoje eu ajudaria a Suzana a preparar o suco do cérebro de um gorila. Por alguma razão várias das nossas vítimas entre os primatas superiores tem nome; hoje eu fiz suco com o cérebro (cerebelo, na verdade) do Oko, o gorila.
O propósito do suco de cérebro é criar uma suspensão dos núcleos das neurocélulas, para que (por amostragem), o seu número e tipo possam ser contabilizados. Para tanto, precisamos:
1) Picar: Com um bisturi. Em fatias, depois a julliene, e, finalmente, em finas lâminas (mecânica e visualmente, é parecido com picar alho).
2) Macerar: O picadinho é colocado em um tubo de vidro com boca abaulada, juntamente com detergente (para quebrar as paredes celulares) e sal (para que os núcleos não explodam por pressão osmótica). Um outro tubo de vidro, com lados asperizados, é então introduzido no primeiro. Com movimentos suaves, o objetivo é ir aspirando pequenas quantidades do picadinho para o interstício entre os tubos de vidro. Um movimento rotatório vai então macerando tais pedaços (dá para ver eles desaparecendo). É um processo trabalhoso, que lembra um pouco misturar risoto (no sentido de que cansa, é repetitivo, e é preciso ficar adicionando líquido aos poucos). Mas o espumante e espesso suco cinzento resultante, após a adição de um contraste de DNA, está pronto para ir para o microscópio, para contagem de células.
Devo dizer que me diverti muito com o Oko. Mesmo alguém tão nerd quanto eu não consegue se envolver com todas as tribos e etnias do Grande Nerdistão. Assim como eu me admirava com as habilidades dos overclockers, astrônomos amadores, gamers e hackers no Campus Party, exatamente por não ser nenhuma destas coisas, eu me espanto com as habilidades e métodos dos biólogos, e com suas diferenças culturais em relação a nós, físicos teóricos. Neste sentido, esta minha experiência está sendo educativa em mais de um sentido.
Falando em Campus Party, de forma totalmente gratuita, eis uma foto para mostrar como a minha vida lá estava difícil.