domingo, 20 de março de 2011

Pousada dos Gravatás, Buzios
De Buzios a Benghazi



Estou em Buzios com a Ceci, para o fim de semana; estou de ferias da usina de Fukushima, dos protestos em Bahrain, Yemen e Siria, e da guerra civil Líbia. Mas mesmo daqui da beira-praia, a realidade insiste em continuar acontecendo.

No Japão, após uma série concatenada de falhas e explosões, as coisas parecem estar se acalmando na usina nuclear de Fukushima. Todos os reatores estão sendo resfriados de uma forma ou de outra, e aos poucos vão sendo ligados à rede elétrica. A situação das barras de combustível "gastas" é mais séria. Como em boa parte dos reatores no mundo (incluindo Angra I e II), tais barras eram armazenadas nos próprio prédios dos reatores, cobertas de, e resfriadas por, agua circulante em grandes piscinas*. Sem energia elétrica, a agua não circula, e é aquecida pelos resíduos de fissão mais ativos. Após algumas semanas, a agua evaporaria, e as barras ficariam expostas ao ar. A combinação de oxigênio e barras superaquecidas poderia então produzir um incendio, que espalharia fumaça contendo Césio-137, Estrôncio-90 e Plutônio-239 por onde o vento a carregasse.


É um cenário potencialmente catastrófico. Felizmente, haveria ainda bastante tempo para agir antes que as barras ficassem descobertas. A não ser, obviamente, se as piscinas fossem danificadas de alguma forma. Por um terremoto, por exemplo.

A maior parte da atividade frenética nos últimos dias em Fukushima consistiu de tentativas de colocar mais água nas piscinas dos reatores #3 e #4. Por helicóptero, por mangueiras de alta pressão ou por qualquer outro meio a ser inventado pela criatividade nipônica. Ao que parece, o pior foi evitado. Quando a energia elétrica for restaurada nos reatores, poderemos repetir esta última frase com mais convicção.

Na Líbia, a guerra civil grassou a semana inteira, com as tropas leais ao Gadhafi indo zenga zenga atrás dos rebeldes. Várias cidades controladas pelos rebeldes foram caindo em rápida sucessão. Com tanques a menos de 200km de Benghazi (capital rebelde), e com Misrata cercada, a nova revolução Líbia parecia natimorta. Porém, após uma enérgica e belicosa ação diplomática francesa (!), um apelo por uma zona de exclusão aérea por parte da liga árabe (!!) e um rápido e decisivo debate no conselho de segurança (!!!), uma resolução foi aprovada (permitindo o uso de todos os meios para proteger civis) que na prática colocou uma coalizão de paises ocidentais e árabes (!x4) em guerra com as forças Gadháficas. Ataques aéreos limitados já ocorreram, e é ainda mais difícil que o usual tentar adivinhar aonde isto vai parar. Então não vou nem tentar, porque quero aproveitar a praia em Búzios, não em Tripoli.

Finalmente, inspirados pelas revoluções e protestos que sacodem o mundo árabe, e iterando a sequência já reprisada alhures de protestos - repressão - criação de martires, grandes distúrbios estão ocorrendo na cidade de Daraa, ns Síria**, que está aparentemente cercada por tanques leais ao governo. Como a Síria tem um dos regimes mais fechados e de sinistra reputação da região (um feito impressionante), o potencial para uma segunda Líbia é alto. Esta é uma notícia relativamente nova, então não tecerei maiores comentários, até pelo menos eu estar de volta ao Rio de Janeiro. Um bom lugar para acompanhar a situação, porém, é no blog com o nome talvez inevitável de 'The Road to Damascus'.



___________________
* Tais piscinas costumam ser o ponto alto de qualquer visita a uma instalação nuclear. As párticulas subatômicas irradiadas, ao se moverem mais rápidamente que a velocidade da luz no meio (agua), geram o equivalente eletromagnético da onda cônica de choque produzida por aviões supersônicos: a chamada radiação Cherenkov, que vemos como um brilho azul fantasmagórico bastante memorável.

** Note que, juntamente com a Argelia, a Síria votou contra a resolução da liga árabe pedindo uma zona de exclusão aérea. Devido a sua história de família, o presidente Assad obviamente não fica muito confortável com o precendente assim aberto.


As ondas da mudança se aproximam do Oriente médio...

3 comentários:

Fabiano G. Souza disse...

Ainda bem que são Gadháficas e não Gandalficas! :)

|3run0 disse...

É que Benghazi não é Moria ;)

Zecao disse...

o site da wikipedia tem uma time line interessante do acidente de Fukoshima.