Casa, Rio de Janeiro
Sgt. Kim's ronery hearts club bomb
A Coreia do Norte testou outra bomba atômica. Ao contrário da última, esta parece ter funcionado a contento (uns 20 kilotons de TNT, dizem, comparável à bomba de Hiroshima). Os suspeitos de sempre emitiram os protestos de sempre. Mas nenhum pais, seja os EUA, Japão, Coreia do Sul ou China, parece querer fazer algo mais drástico a respeito. Na verdade, ninguém parece saber muito saber o que fazer.
Me parece que a incapacidade da comunidade internacional para tomar algum tipo de ação coordenada eficaz a respeito da CdN se deve a dois medos quase ortogonais: O medo de uma guerra devastadora contra um inimigo formidável em uma das regiões mais importantes (e densamente povoadas, e industrializadas) do mundo, e o medo de um colapso economico e social norte-coreano.
Em relação ao primeiro medo, a CdN nunca precisou de bombas atómicas para dissuadir um ataque dos EUA: A ameaça de suas forças convencionais, em particular no referente a Seoul, é e sempre foi mais que suficiente para isso. Porém (muita gente acredita), se pressionada demais, e não tendo nem escrúpulos nem literalmente nada a perder, a liderança norte-coreana poderia lançar um ataque* final desesperado. É uma guerra que a CdN provavelmente iria perder, mas isto seria de muito pouco consolo para os milhões que iriam morrer antes que isto acontecesse. Deste ponto de vista, ceder a chantagem relativamente barata da CdN parece realmente um opção menos danosa, financeira e moralmente.
A outra possibilidade para a CdN é, obviamente, um colapso. O fim de um regime tão grotesco não vai deixar ninguém com saudade. Mas depois que cessarem as comemorações, a comunidade internacional (e a Coreia do Sul e a China em particular) vão se descobrir responsáveis, por exclusão, por uma sociedade brutalizada formada por milhões de miseráveis mal-nutridos, e com uma economia arruinada. Os custos da reconstrução, que se arrastaria por décadas e seria uma âncora no crescimento económico da região, fariam o preço da reunificação alemã parecer troco. Novamente, deste ponto de vista, deixar que os norte-coreanos continuem sendo responsabilidade do Kin Jong Il, e oferecer alguma ajuda modesta, mas suficiente para adiar um colapso completo, parece ser a alternativa mais simples e menos custosa.
Assim, o grupo dos 6 continua a negociar, e a emitir condenações sonoras mas ineficazes, e a fingir acreditar que o Kim esteja negociando de boa fé. O teatrinho vai continuar enquanto as concessões e auxílios económicos continuarem mais em conta que as alternativas. Imagino que secretamente os negociadores torcem para que a CdN siga pelo menos alguns passos d da China e se torne um pais mais ‘normal’, um pouco menos despótica e com um economia um pouco mais funcional. Nos últimos anos, a CdN mudou bastante, de fato, mas não me parece certo de que seja para melhor.
Neste contexto, a bomba atômica representa menos uma ameaça militar iminente, e mais uma maneira da CdN aumentar o seu ‘preço’, ao tornar ainda mais terríveis as alternativas (’Seoul e Tóquio radioativas!’, ‘Bombas atômicas a solta em uma anarquia pós-stalinista!’). A contenção da Coreia do Norte fica mais cara, mas sua lógica permanece a princípio válida.
O problema (para todos os envolvidos, norte-coreanos inclusive) é que a introdução de armas nucleares introduz um fator novo importante, que não está incluído no cálculo acima: A proliferação.
Por um lado, os vizinhos e quase-vizinhos da CdN já estão investindo pesadamente em armas anti-balísticas. Coreia do Sul, Taiwan, e (principalmente) Japão têm a capacidade técnica de rapidamente obter bombas atômicas e coloca-las em misseis. A península Coreana não é a única área de conflito potencial na região, e o surgimento de destas novas potencias nucleares (seguidas, possivelmente, de Vietnã, Indonesia, Singapura, Austrália, etc) criaria diversos conflitos nucleares em potencial.
Por outro lado, existe muita gente neste mundo com dinheiro de sobra que gostaria muito da tecnologia de bombas e misseis que a CdN tem, e nunca teve problemas em vender. A maior parte dos casos recentes de proliferação nuclear e de misseis balísticos têm envolvimento norte-coreano (e paquistanês, incidentalmente). Com uma bomba testada e aprovada, e a capacidade de produzir material físsil, a Coreia do Norte tem a capacidade de tornar realidade os sonhos de qualquer maluco com mais petrodolares do que bom senso.
A questão é: se a politica anterior de contenção e ‘diálogo’ já não é mais aceitável, nem tampouco as são as alternativas que se apresentam (guerra preventiva ou um se-vira-malandro global). Estamos precisando urgentemente de alguma ideia nova.
PS: Este post é uma adaptação de um comentário que fiz no blog do Pedro Dória. Quem quiser penetrar no universo paralelo do querido mas ronery leader, é só ler os surreais press releases da agencia de noticia dele. Ou ouvi-lo cantar.
Finalmente, para quem tem o prazer mórbido de querer saber quanto estrago exatamente uma bomba atômica de x kilotons faz, o Wolfran Alpha tem as respostas.
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* O objetivo seria provavelmente um ataque rápido para tomar algum território, para logo em seguida iniciar ‘negociações’ de uma posição de força. Mas eu duvido muito que a guerra seja ‘parável’ neste estágio.