Domingo passado fiz um almoço para o Bernardo, Carla e Júlia, que voltaram recentemente de Londres, para a Naira, e que contou com uma participação especial da Suzana, Carlos, Luquinha e Lulu. Fiz quase o mesmo menu do jantar na casa da Mari, exceto pela falta do risoto e acréscimo do crepe de nutela com calda de laranja (havia feito crepes no sábado tb).
Após acordar, tomar café e reassumir a minha condição de ser humano, saí de bicicleta com o Gabriel para dar uma volta na Lagoa e comprar os ingredientes. Era uma dia tranquilo, e fiquei só ligeiramente surpreso quando vi um jogo de baseball em curso perto do corte do Cantagalo. Fiquei um pouco mais surpreso com dois hoplitas, muito bem paramentados com couraças, elmos crinados, escudos estampados com górgonas e lanças, treinando na grama ao lado da ciclovia. Inevitavelmente, parei para perguntar o que diabos era aquilo, meio esperando ser chutado lagoa adentro por um dos hoplitas aos gritos de 'This is Espaaartaaaaaa!!!!'.
Quebrando um pouco o clima, aquele que parecia ser o líder dos myrmidons ersatz me disse amavelmente que eles eram um grupo de recriação histórica (como e.g. a SCA), que treinavam todo sábado, e ainda que eu seria muito bem vindo. Tenho que admitir que fiquei bastante tentado. Adoro a ideia de atingir os amigos com instrumentos pontiagudos e ainda chamar isto de esporte.
Andando mais um pouco, vi um casal em animada conversação em um pier, enquanto eram filmados por uma equipe completa. Imaginei que fosse alguma cena de novela; mas a conversa rendia e rendia, sem nenhuma acrimônia aparente, o que me parecia bem pouco típico para o padrão Globo (ou Record, ou Televisa) de melodrama. Meus devaneios foram interrompidos, porém, pela cesta da bicicleta, que sem dar explicações resolveu se soltar e bater de forma barulhenta no chão. Consegui com algum esforço retirar o Gabriel da bicicleta e levá-la até a grama. Com a simpática ajuda de uma moça que fazia parte da equipe de filmagens e o auxílio material de funcionários do quiosque próximo, improvisei um conserto McGuyveriano com um pouco de arame e meu canivete. Enquanto agradecia pela ajuda, inevitavelmente ('é minha natureza', como diria o escorpião na fábula) perguntei à moça o que eles filmavam. Era um programa piloto dedicado a bicicletas, ela me disse. Obviamente, achei a ideia interessante, e mencionei de passagem que eu não só gostava muito de bicicletas, como as usava para ir trabalhar. Foi a vez dela de ficar animada. 'Será que você poderia' - ela perguntou - 'nos dar uma entrevista?' Respondi que sim, imaginando uma ou duas perguntas rápidas. Mas a ideia dela, um tanto mais elaborada, era me filmar saindo de casa, e chegando no trabalho, e depois me fazer algumas perguntas. Tudo bem. A equipe iria lá em casa na segunda feira, e (imaginei) em 15 ou 20 minutos teriam as imagens e respostas que precisavam.
Eles chegaram, como combinado, as 9 da manhã. A minha condição humana ainda era um tanto precária quando fui recebe-los.
"Então você coloca o capacete e filmamos você enquanto se prepara"
"Err... Eu não costumo usar capacete na ciclovia, e a minha preparação consiste de pegar a bicicleta e sair pedalando"
"Mas onde você leva as roupas de trabalho?"
"hmmmmm, quando está muito quente eu levo uma camiseta extra, mas eu trabalho assim mesmo [de bermuda e chinelo]"
Não sei se eles ficaram decepcionados por não conseguirem imagens a lá Rambo de um atleta-filósofo colocando capacete, sapatilhas, camiseta de microporos, medidor cardíaco, GPS, faca, M-60, granadas (talvez não esperassem estas últimas). Mas eu precisava de um capacete, para dar o exemplo (no que alias eles têm toda a razão), e um capacete foi providenciado.
A entrevista foi bastante simples. Acho que a ideia é que eu fale em off (tipo no final original de Blade Runner!), então só minha voz foi gravada, enquanto eu discorria sobre as diversas vantagens da bicicleta e tentava não dizer nada de muito bizarro.
A primeira cena, na qual eu fazia o papel de "Bruno Mota, um físico que vai de bicicleta para o trabalho", consistia em colocar o capacete, retirar a corrente, e sair pedalando da garagem. Me enrolei com a corrente na primeira tomada, sai muito rápido na segunda, mas acertei na terceira. Em seguida, uma tomada na qual nosso intrépido herói segue pela Bartolomeu Mitre e atravessa a Ataufo de Paiva. Depois, combinamos de nos encontrar em frente ao posto 9, para que me registrassem pedalando pela ciclovia em Ipanema. Finalmente, nos encontramos no CBPF, onde os confusos seguranças me viram entrar e sair pela portaria principal três vezes seguidas. Pendurei então a bicicleta no bicicletário (duas vezes), e nos despedimos.
No final, a coisa toda demorou muito mais do que eu esperava. Na minha inocência, achei que um segmento de alguns poucos minutos demoraria outros tantos para ser filmado. A equipe toda foi extremamente simpática, e um programa sobre bicicletas certamente é uma ótima ideia. Eles ficaram de me mandar uma cópia quando a edição ficar pronta, mas não há ainda uma data ou emissora para anunciar. Vamos ver como me saí.
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